12.28.2006

Reportagem (17): Retrospectiva 2006

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Shows nacionais, bandas boas (e algumas nem tanto) surgindo, outras sendo (re) apresentadas: assim foi uma parte desse 2006 em Santa Maria mostrado pelo Cenabeatnik
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Última semana do ano, emissoras de televisão fazendo as suas retrospectivas, revistas semanais escolhendo os personagens que se destacaram nos últimos 12 meses, jornais diários selecionando aquilo que de mais importante aconteceu em 2006 para seus cadernos especiais e, por trás de tudo, cada pessoa fazendo (ou começando a fazer) um balanço do que de bom e ruim aconteceu neste sexto ano do século 21. Nada mais natural, então, que o blog também faça a sua retrospectiva. E dá gosto de fazê-la quando uma pequena olhada para trás já é suficiente para dizer que, sim, 2006 foi bom para o cenário musical santa-mariense.


Em primeiro lugar, um ponto que muito incomodava as bandas locais, o de que a cidade não tinha lugares decentes para se tocar, hoje procede só em parte, porque muitos bares e boates dos mais variados estilos passaram a funcionar em 2006 – e alguns com as portas bem abertas para as bandas de Santa Maria. Ainda assim, se a grande maioria destes ainda continua com métodos “esdrúxulos”, para dizer o mínimo, de seleção de bandas, pelo menos outros incentivam a produção local, organizando festas e shows de qualidade sem medo de ousar e criar novos públicos.

Em segundo lugar, muitas bandas novas – e de qualidade – surgiram nos palcos santa-marienses. Com o acesso à música cada vez mais facilitado pela internet, não é mais preciso procurar tanto para se achar pessoas com “afinidades musicais”, o que torna a união destes em prol de um objetivo comum mais fácil.

Com estes dois pontos citados acima é que se cria uma “cena” musical em qualquer parte do mundo. Bares sem medo de abrir para bandas novas incentivam músicos que acabam por identificar um público mais receptivo para as suas composições, e assim está feito o espaço para a criatividade trabalhar. Não se tem como saber se a qualidade musical virá também junto dessa criatividade, mas uma coisa é certa: quanto maior a quantidade de bandas surgindo, mais provável é que algumas delas sejam realmente boas.(...)

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1. Shows nacionais, festas originais





Pode até parecer exagero, ou então um exercício frustrado de futurologia, mas daqui a alguns anos muita gente vai passar pela rua Floriano Peixoto, nas quadras entre a rua Astrogildo de Azevedo e a avenida Presidente Vargas, e vai lembrar de 2006. O local certamente foi um dos mais movimentados na noite da cidade, e grande parte desse movimento se deve ao Macondo Bar. Visto por muita gente como um lugar “alternativo” demais, o bar se consolidou neste ano trazendo bandas conhecidas do cenário independente nacional como Autoramas (na foto acima, o vocalista Gabriel Thomaz), Walverdes, Pata de Elefante, Superguidis, Zefirina Bomba, Júpiter Maçã, dentre outros, e organizando festas para os mais variados gostos, desde para os saudosos pelos sons oitentistas aos apreciadores do fetichismo. Formou um público que se acostumou a escutar o novo e não estranhar, e de quebra se tornou também o principal palco para novas bandas santa-marienses.

Na metade deste mês, o Macondo se mudou; foi para um sobrado maior (foto ao lado) na rua Serafin Valandro, na quadra entre a Venâncio Aires e a Andradas, perto duma conhecida escola de idiomas. A previsão é que ainda no final deste ano bar já comece a funcionar.

Fica a pergunta: será que em 2007 será lembrado como o ano dessa quadra da Valandro?

Esse é novo futuro Macondo, na Valandro

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2. Bandas novas e a volta de velhas conhecidas




O ano de 2006 foi de surgimento de muitas bandas em Santa Maria, e algumas delas estiveram por aqui. A Crema (foto acima) apareceu lá no início do blog, no segundo post (2 de julho), como uma das promessas locais, e no decorrer dos meses acabou se confirmando como umas das boas bandas de rock’roll da cidade. Diversos shows no Macondo Bar, a maioria com boa presença do público, deram o gás necessário para o lançamento do primeiro single, “Você sabe sim”, em novembro, consolidando a banda como um “elo perdido” entre o lado b santa-mariense, mais alternativo e “diferente”, e o lado a, radiofônico, pop (ou rock) sem vergonha de o ser.
Outras bandas novas que estiveram por estas páginas neste ano foram a Consuelo, com sua inusitada mistura de rock, funk e música latina, a Sálvia, talvez a única banda local de reggae, e as vencedoras do maior festival de bandas do interior do estado, o Universo Pop: Polimorfia e Agente Six.





Mas nem só de coisa nova se fez a cena musical da cidade; algumas velhas conhecidas do público local voltaram à ativa com modificações. A Lactuca Sativa (na foto acima, três dos cinco integrantes da banda), depois de uma breve parada decorrente da saída do vocalista, voltou a tocar em Santa Maria com nova formação, divulgando o segundo disco e lembrando alguns velhos hits da banda, como “Dedo Duro” e “Gasolina”, que deixaram sua marca em boa parte da geração que hoje tem entre 18 e 20 e poucos anos.

A Sapato Vermelho, que ganhou bastante reconhecimento com a participação de sua primeira vocalista, Shirle de Moraes, no programa da TV Globo “Fama”, voltou aos palcos com uma nova vocalista, Franciele.

A T.S.F continuou perpetuando a barulheira, mas agora Brasil afora, com duas tours para além do estado e uma indicação para melhor álbum de hardcore nacional no prêmio da Revista Dynamite, além de ter lançado um DVD sobre o giro que fizeram pelo RS junto dos alemães da 54 Suicides.

Outras que fizeram 2006 o ano de volta à ativa foi a Inseto Social e a Doce Veneno, dos conhecidos Sininho e Guilherme Barros, que fez um belo show na boate Confraria na metade deste ano. Vale contar ainda o espetáculo de som e luzes que foi a apresentação da Nocet lançando seu segundo disco, “Bullets”, no Hotel Itaimbé, e a união das bandas de metal da cidade para a organização das duas edições da Hammer Fest realizadas neste ano.

- Jornal A Razão, 28 de Dezembro-

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12.22.2006

Review (6): O "novo" disco dos Beatles

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Recém lançado, “Love” é uma colagem de várias músicas dos fab four para um espetáculo milionário do Cirque du Soleil


Trinta e seis anos depois do fim dos Beatles , um novo disco da banda mais importante do século XX é lançado. Logo vem a pergunta: é mais um caça-níquel ou um disco de “raridades” que nunca havia sendo lançado? A resposta correta seria nenhuma das duas. Love, que acaba de ser lançado pela EMI no país, é um trabalho artesanal de colagem de trechos de mais de 130 músicas do grupo britânico feito sob encomenda pelo produtor máximo do grupo, George Martin, em parceria com o seu filho Giles, para um espetáculo do badalado Cirque du Soleil (aqui é a página oficial do espetáculo)


Os beatlemaníacos podem até virar a cara, mas os Martin fizeram um bom trabalho. Não profanaram a obra do grupo colocando elementos eletrônicos, como poderia acontecer; simplesmente misturaram trechos de diversas músicas - em sua maioria da fase mais criativa do grupo, de Revolver (1966) ao Abbey Road (1969) – e fizeram releituras que não descaracterizam as canções e sim as dão outra roupagem, juntando riffs de uma música com solos de outras de maneira tão incrível que dá até para se perguntar “mas a música original não era assim também?”. Não, não era, mas coisas como “Get Back” com o riff de “A Hard Day’s Night” parece que nasceram desta forma, juntas, tal é a maneira quase perfeita com que se encaixam. Outro exemplo: as duas faixas (talvez) mais psicodélicas da carreira dos Beatles, “Tomorrow Never Knows” e “Within You Without You” casam perfeitamente a cítara indiana da última com a batida quase eletrônica da primeira, formando um caldeirão sonoro incrivelmente coeso e poderoso.


A única gravação nova no CD é um arranjo de cordas composto por George Martin, hoje com 80 anos, para um take alternativo de “While my guitar gently weeps”, uma das poucas músicas da banda composta por George Harrison. No entanto, tudo o que se ouve nas 26 faixas soa de alguma forma novo, não como uma mera recompilação, e parte dessa sensação se dá pela turbinada que os Martin deram no som, já que a grande maioria dos discos originais dos Beatles nunca foram remasterizados e ainda tinham um som que deve bastante às gravações de hoje.



-Jornal A Razão, 21 de Dezembro de 2006-


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Aqui vai o link para quem quiser baixar o álbum, que tem quase 80 MB, mas vale cada espacinho que ele for ocupar no seu HD.





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12.19.2006

Notas (8)

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Ipod bagacero




O site promocional do Ipod, tocador de MP3 que é um dos “símbolos” do mundo moderno, divulgou recentemente um novo produto pra lá de inusitado: trata-se de um vibrador que funciona de acordo com o ritmo e a intensidade do som. O aparelho da Suki, chamado de OhMiBod, pretende “aprofundar” a experiência musical, combinando as sensações de escutar e sentir a música, literalmente.

Apesar de seguir a mesma linha de design do IPod, o OhMiBod é compatível com outros players. Além disso, o aparelho pode ser programado para funcionar de modo tradicional, sem a necessidade de música simultânea. A grosso modo, quando conectado no tocador, as vibrações oscilam em intensidade de acordo com dois fatores: volume e o gênero musical. Assim, é possível controlar os níveis de potência do vibrador apenas diminuindo o volume ou trocando de música.
Os usuários do produto já podem até desfrutar de uma comunidade virtual dedicada a troca de experiências, sugestões e discussões sobre quais são as playlists mais sexy do momento, o ClubVibe. O site oferece também compilações de DJs feitas especialmente para quem deseja tirar o maior proveito possível do OhMiBod.

O aparelho que une tecnologia, prazer e design, pode ser encontrado por U$ 69 nos EUA, ou encomendado no site do produto . No Brasil, ainda não há previsão de lançamento.


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12.15.2006

Reportagem (16) : O novo Macondo

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Última atividade do bar na rua Floriano Peixoto é hoje. Novo bar pretende reabrir no fim deste mês.


Depois de cerca de 20 meses de atividade, o Macondo Lugar, nome oficial da hoje conhecida “casa verde da Floriano”, vai trocar de lugar. A partir do final de dezembro, o bar vai funcionar na rua Serafin Valandro, entre a Venâncio Aires e Andradas (veja fotos).

Num espaço maior, o novo Macondo terá novidades: no primeiro andar, funcionará um bar nos moldes tradicionais que abrirá às 19h, com mesas e som ambiente. No segundo piso, interligado com o 1º, ficará o espaço para show, que vai abrir por volta das 23h. No subsolo, um conjunto de bandas associadas ao bar vai administrar um pequeno estúdio para ensaios, e o selo de roupas Rock Horrível, que em alguns shows já montava sua banquinha no local da Floriano, agora vai ganhar um lugar fixo, aberto do início da tarde até por volta das 21h.





A justificativa da mudança é contada por Jeff, um dos sócios do local:
_ Quando assinamos o contrato já sabíamos que teria de deixar o atual endereço em cerca de 20 meses. Como a gente não gosta de ficar parado, partimos para um outro lugar - diz.
O prédio atual será devolvido aos donos e, possivelmente, demolido. Desde já fica a lembrança de um lugar que, praticamente sozinho, criou uma "cena" alternativa na cidade, seja com shows de bandas interessantes do país ou mesmo festas com temáticas bastante diferente do que Santa Maria estava acostumada a sediar. O mérito do pessoal do bar também vai no sentido de não ter preconceito com festas/pessoas que praticamente toda uma sociedade "tradicional" ignora e, na tentativa de escondê-la como faz com seus ditos problemas, os trata como párias. A expectativa é de que, o bar continuando com a mesma proposta mas funcionando noutro local, Santa Maria até se acostume com esses párias e, aos poucos, vá perdendo o preconceito em categorizar em mais e melhor aqueles semelhantes da "classe" ou "grupo" a que cada um pertence.






Macondo Circus 2 - A segunda edição do Circus acontece neste final de semana no balneário Parque Serrano, em Itaara. Evento síntese das festividades do ano do Macondo, nesta edição o festival contará com shows de 12 bandas locais e uma nacional, o Bad Cock, do paulistano Hansen, ex-integrante da banda santista Harry. Além disso, haverá uma tenda com o melhor das festas mais tradicionais do bar, como a Fetish Fest, Clube da Criança Junkie (música dos anos 80 e início dos 90), Bela Lugosi is Dead (metal, gotic-rock) e Galo preto (música brasileira), dentre outras. O início do evento está marcado para o sábado à tarde e as linhas Jardim da Serra e Lourenci mantêm ônibus para o balneário até as 23 horas de sábado. O balneário fica a 300m da faixa e tem amplo espaço para estacionamento e camping.

Confira a relação das bandas santa-marienses que vão tocar no evento: TSF, Red House, Palo, Jokers, Tranze, Sapato Vermelho, Crema, Scarpast, Exumados, Sálvia, Voodoo e Daniel Rosa.

-Jornal A Razão, 14 de Dezembro de 2006-

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12.13.2006

Notas (7): Acústicos mundo afora

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Dois acústicos foram gravados pela MTV na semana passada, um no Brasil e outro nos Estados Unidos. O sempre rebelde Lobão, ex integrante das bandas Blitz e Vímana, gravou o seu em duas noites no Estúdio Quanta, em São Paulo.
Crítico ferrenho da estratégia das grandes gravadores e também da própria MTV, o cantor justificou a sua “traição” dizendo que o disco também é uma forma de mostrar o alcance do jabá no país:
_ Agora que eu gravei um acústico MTV quero ver se minhas músicas vão tocar nas rádios, se vai rolar uma grana da gravadora para elas tocarem - disse ele.

Com cenário dadaísta assinado por Zé Carratu, em que molduras de quadros de todos os tamanhos se harmonizam, Lobão desfilou versões unplugged de alguns de seus sucessos como "Decadance Avec Elegance", "Me Chama", "Rádio Blá" e "Corações Psicodélicos". Outros hits, como "Vida Bandida" e "Cena de Cinema", não entraram no programa. A fase independente de sua carreira teve espaço considerável, indo desde "El Desdichado" e "A Vida É Doce" até "Você e a Noite Escura", de seu último disco. O show contou ainda com uma canção composta com Lulu Santos nos tempos de Vímana, "O Mistério", e a participação de Beto Bruno, Marcelo Gross e Pedro Pelotas da Cachorro Grande em "A Gente Vai Se Amar".
(Coisa boa deve ter saído desse acústico).



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Já nos Estados Unidos, uma dos últimas sobreviventes do falido new-metal, a banda Korn, deixou as guitarras de lado para gravar o novo Unplugged MTV no último sábado dia 9 de Dezembro, em Nova York. O show teve direção musical de Alex Coletti e os convidados Chester Bennington, do Linkin Park, Amy Lee, do Evanescence, e membros do The Cure. A previsão de lançamento do trabalho é 20 de fevereiro do ano que vem (se fosse adiado por mais um tempo, não faria falta... aliás, se nem saísse o disco, e o Korn resolvesse acabar de vez, como a tempo vem definhando junto com o new-metal, seria melhor ainda).


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12.09.2006

Reportagem (15): O som dos Six

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Em nove meses de atividade, a banda Agente Six já ganhou três prêmios em festivais por Santa Maria e região.



Do nome ao número de integrantes, passando pelo dia em que foi formada à hora que tocaram no Universo Pop, o número 6 acompanha a banda Agente Six. Mais do que acompanhar, o 6 talvez venha dando sorte: com apenas nove meses de atividade, a banda já ganhou três prêmios: 1º no Universo Pop (categoria Música nas Escolas), 3º no Festbanda de São Pedro Do Sul e, mais recentemente, 2º lugar num festival de bandas do Colégio Manoel Ribas – nessa última, perderam para um grupo de música nativista. Os prêmios, além de incentivar o trabalho da banda, mostram que eles são mais do que um representante do som “emo” na cidade, pecha que, através de uma reportagem sobre o estilo na cidade, acabaram ganhando:

_ Eu e o meu companheiro de banda, o Luismar (vocalista), somos emos, gostamos do estilo musical e nos identificamos, mas o resto da banda não, cada integrante tem o seu estilo, e o nosso som é uma mistura das influências de cada um - diz Rafael, 20 anos, o outro vocalista da banda. Uma audição da música com que ganharam o Universo Pop, “Destrua”, prova exatamente isso: a letra e os vocais, revezados entre Luismar e Rafael, tendem ao estilo emocore, mas a parte instrumental é variada, com uma pegada mais ligada ao rock’roll tradicional do que propriamente ao hardcore. Inclusive há um solo de guitarra, algo bastante raro de ser encontrado em músicas de bandas do estilo.
_ Fica a critério de cada um botar um rótulo na gente; se quiserem dizer que é emo, que é pop-rock, punk, que seja - completa o vocalista Luismar, 19 anos, estudante de Psicologia da UFSM.


Algo que chama atenção na Agente Six é a formação; além de ter dois vocalistas principais, algo incomum em bandas da cidade, há também uma menina no baixo, Bruna, 19 anos, estudante de Biologia na UFSM.
_ O pessoal costuma achar que ela é que canta, como normalmente acontece - brinca Luismar.
Completam a formação ainda os guitarristas Carson, estudante de Química Industrial da UFSM, e Matheus, que faz Engenharia Mecânica na mesma instituição, os dois com 20 anos, e o baterista Fernando, 19, estudante de Ciências da Computação da UFSM. Este último é o representante da veia “metal” da banda, inclusive usando pedal duplo (algo comum nos bateristas de heavy metal) em algumas músicas da banda.


O guitarrista Matheus e a baixista Bruna com o prêmio do Universo Pop



Além das seis músicas próprias que eles já tem gravado, o repertório da Agente Six conta com canções de grupos como CPM22, Raimundos, Green Day, Offspring e até mesmo Raul Seixas e Paralamas do Sucesso.
_ No último show que fizemos, no festival do colégio Maneco, resolvemos de última hora fazer um medley de “La Bamba” e “Twist and Shout” e ficou bem legal também - diz Rafael.
Com os prêmios conquistados recentemente, a banda espera tocar mais na cidade.
_ Foi uma surpresa a gente ter ganho o Universo Pop já da primeira vez em que participamos, com tanta banda boa concorrendo. O prêmio no festival do Maneco já nos rendeu um outro show, e assim, aos poucos, nós vamos indo - finaliza Luismar.


Contatos:
3221 4688/ 9119 6776 com Luismar

Site (dá para escutar algumas músicas da banda);
Fotolog




- Jornal A Razão, 7 de dezembro de 2006 -


Foto: Osvaldo Melo


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12.04.2006

Notas (6): Nocet lança disco novo

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Formada no já longínquo ano de 1989, a Nocet é a única banda da "velha guarda" do rock santa-mariense que está em atividade; mas não naquela "atividade" de fazer shows enquanto o pessoal não arruma outra atividade mais lucrativa, ou então como hobby - ou vício - de tocar as velhas músicas sempre: eles estão na atividade mesmo, compondo novas músicas, tocando quase toda a semana em locais de Santa Maria e região.


Tanto é que, nesta quarta-feira 6 de Dezembro, eles lançam o seu segundo CD, Bullets, em mega-show no salão de eventos do Itaimbé Palace Hotel, local em que a platéia, sentada, vai poder ver ainda melhor o espetáculo de luzes que eles planejam fazer. Os ingressos estão a venda por vários locais de Santa Maria, e mesmo com o calor infernal que faz na cidade por esta época (imagina o que virá em janeiro...), a expectativa é de lotação esgotada, afinal, como o início desse texto disse, a Nocet é a única banda da "velha guarda" do rock santa-mariense em atividade.




A atual formação da banda (na foto acima, da esquerda para a direita) inclui Marcus Molina (baixo e voz) e Fabrício Soriano (bateria), da formação original, e mais Benhur Borges (guitarra).


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Mas quem quer lembrar de como era a Nocet das antigas - com o irmão de Marcus, Renato Molina, nos vocais e Gustavo Assis Brasil , hoje professor de jazz nos EUA, na guitarra - pode ver essa pérola em forma de videoclipe da música "It will pass by me".
Atenção especial no visual da banda, bem de acordo com a época (o clipe é de 1992) hard-roqueira que Santa Maria vivia.

No site da banda dá para escutar as músicas do disco novo, e também algumas das antigas.


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Fotos: Daniel Petry, vulgo Fokks. (do site da banda)


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12.01.2006

Reportagem (14) : No estúdio com a vencedora

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Com apenas 3 meses de atividade, banda Polimorfia foi a ganhadora do Universo Pop deste ano na categoria Livre



Realizado no último fim de semana, no ginásio do Clube Dores, o festival Universo Pop reuniu cerca de 74 bandas, que disputaram os prêmios em duas categorias: Livre e Música nas Escolas, além de premiações individuais. A banda vencedora na categoria livre foi a Polimorfia, formada por quatro ex-integrantes da banda Rua XV e pelo vocalista Marcopolo Maia, que também levou o prêmio de melhor interprete do evento.


1) Ambientação

É numa terça-feira à tarde algo nublada que os cinco integrantes da Polimorfia recebem o CenaBeatnik para a entrevista. O local é o próprio estúdio da banda, que eles mantêm na casa do baterista Maurício Hoffmann, no bairro Duque de Caxias, perto da matriz do supermercado Dois Irmãos. Passado um pouco da hora marcada, o anfitrião Maurício vem à frente de casa, dá um chega para lá no seu cachorro (pequeno, mas valente como todos os pequenos) e conduz o repórter rapidamente ao estúdio no fim do pátio, onde a banda já espera sentada tranquilamente. Todos se levantam, se apresentam e, nem questionados, já começam a falar. Puxados pelo baterista, e aditivados pela ansiedade que toda entrevista parece causar, falam bastante; sobre a banda em que quatro dos cinco integrantes tocavam (a Rua XV), sobre os gostos musicais de cada um (o hard-rock predomina, mas o metal, a música clássica e o jazz estão presentes também).
Cinco pessoas falando quase ao mesmo tempo torna difícil a compreensão total do assunto, principalmente quando o interlocutor está no meio e tenta olhar para todos os lados, na tentativa de enxergar quem fala o quê. Mas o início costuma ser assim, a banda tentando causar uma boa primeira impressão e o repórter ainda entrando no contexto da situação.

2) Contexto sendo explorado

Poucos minutos depois, já se identifica os integrantes da banda. Sentados em meia lua, com o repórter no meio, estão, da esquerda para a direita: o já citado Maurício, 18 anos, o guitarrista Rafael Reis, 19, o vocalista Marcopolo Maia, 22, o baixista Adelar Martins, 19, e o também guitarrista Guilherme Marin, 20. Pergunta-se sobre o Universo Pop; Maurício responde prontamente:
_ Foi legal, tinha bastante banda de qualidade, o palco era bem grande, dos que a gente não vê pela cidade.
Marcopolo complementa:
_ Eram 10 minutos só, a gente teve que mostrar uma boa organização para ajustar os instrumentos e já começar a tocar. Mas a reação do pessoal foi boa; quando começamos a primeira, “Cochise”, do Audioslave, as pessoas vieram para a frente do palco, agitaram. Depois ainda tocamos a nossa, “Seja você".
Essa última, que já toca em uma rádio local, é a primeira de mais três músicas prontas que a Polimorfia têm, fora as que estão em fase de composição:
_ Esses dias estávamos trabalhando numa que o Rafael trouxe. Vamos ver se até o fim deste ano ou o início do ano que vem temos músicas suficiente para gravar um CD”, diz Maurício.





3) Perguntas inevitáveis

Numa entrevista com bandas ainda desconhecidas do grande público, certos questionamentos são inevitáveis; por mais batidas que sejam, são perguntas que devem ser feitas, de alguma maneira, em algum período. A primeira: Por que do nome Polimorfia? Novamente Maurício é quem esclarece:
_ Bom, poli significa várias, morfia é forma. Várias formas seria a tradução. É mais por causa das nossas influências, que são diversas, mas tende ao mesmo ponto em comum, que é o hard-rock de bandas como Van Halen, TNT, Audioslave e das santa-marienses Fuga, Doce Veneno, Feeling.
A segunda pergunta, que seria sobre as influências da banda, acaba de ser respondida. Passamos a uma terceira, que no contexto se torna inevitável: Quatro de vocês tocavam na Rua XV, por que não resolveram continuar com o mesmo nome?
_ Queríamos diferenciar o som, ser mais rock, e para isso tínhamos que trocar de nome, começar quase do zero mesmo. Antes não podíamos evoluir juntos, coisa que agora fazemos porque todos estão no mesmo nível musical, diz Maurício.


4) Audição e uma inquietação

Após a conversa, é hora da audição. A banda põe para tocar três músicas: “Seja você”, e duas covers (“Cochise” e “É Proibido Fumar”). Esta última, em versão quase heavy-metal – usar a referência altamente técnica do metal nas versões e músicas próprias é algo comum para a banda - surpreende pela excelente qualidade e pela criatividade, o que não é muito comum quando se fala em cover.
Mas quando do aparelho sai a música “Seja você”, surge um pouco de desapontamento: apesar de ser um hard-rock bem feito, com a parte instrumental muito bem tocada, os clichês de uma “música para tocar em rádio” estão todos ali, límpidos, para quem quiser ver: o solo da introdução, o refrão pegajoso, a letra com pitadas de auto-ajuda, a fórmula previsível do andamento da canção, etc.
Como a banda diz, “Seja você” é a provável carro-chefe do primeiro Cd – o que leva a uma constatação: o problema não é das bandas que repetem a mesma fórmula, mas sim das rádios que exigem essa fórmula já gasta para que as músicas toquem em sua programação.


-Jornal A Razão, 30 de Novembro de 2006-
Fotos: Paulo Pires


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Veja os outros vencedores do Universo Pop:

Categoria livre
1º ) Polimorfia (Santa Maria)
2º ) Advertência (São Sepé)
3º ) Nitra (Santa Maria)

Categoria música nas escolas
1º) Agente Six (Santa Maria)
2º) Púrpura (Santa Maria)
3º) Lancaster (Santa Maria)

Melhor Interprete – Marcopolo Maia – Polimorfia (Santa Maria)
Melhor Composição – Estrela da Manhã - Rastros de Sol (Santa Maria)
Música mais popular – Anestesia (Palmeiras das Missões)
Melhor Instrumentista – Trio de metais da banda Advertência (São Sepé)



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11.24.2006

Reportagem (13): A noite dos roupas-pretas

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Festa “Bela Lugosi is Dead”, em sua quarta edição, reúne os apreciadores dos sons góticos em Santa Maria



O amplo salão de paredes verdes escuras reverbera o som do baixo distorcido saído dos alto-falantes. A luz baixa mal ilumina os convidados que, em movimentos desconexos, no ritmo das batidas secas das músicas, vão entrando e se deixando levar pela atmosfera sombria que esperavam encontrar e encontram. A série de produtos (filmes, clipes, programas de TV) que eles estão acostumados a consumir, agora, como que num sonho, se materializa, e as fantasias com que se imaginavam diante da tela agora vestem os seus corpos sedentos por diversão e, por que não dizer, alegria. Cada um cria a atmosfera que imagina ser a mais adequada a sua memória visual; já a memória sonora é parecida entre todos, e é nela que se baseia todo o arcabouço mental que tornou possível essa materialização de idéias aparentemente desconexas em apenas uma festa, um lugar, num espírito que tem como símbolo uma cor: o preto.


O parágrafo acima poderia ser até a descrição de uma festa num hipotético filme de terror. Mas, na bem da verdade, é um exercício de imaginação de como pode ser o ambiente da festa que ocorre neste sábado, no Macondo Bar: A Bela Lugosi is Dead. Pela quarta vez no ano, Santa Maria vai ter a sua “noite dos roupas pretas”, destinada ao pessoal que curte ou deseja conhecer mais dos sons considerados góticos.

Organizado pelo estudante de química da UFSM José Neto, mais conhecido como Zé, a festa já indica suas referências desde o nome: “Bela Lugosi is Dead” é uma música da banda inglesa Bauhaus, considerada como uma das criadoras do chamado gothic-rock que, por sua vez, nomeou a música em referência ao clássico ator de filmes de terror Bela Lugosi (veja mais logo abaixo).

O som, desde a primeira edição da festa, ficou a cargo de Wandeclayt, autoridade na cidade em matéria de sons eletrônicos mais obscuros.
“Entrei para dar suporte ao Zé. Cuidaria da parte visual da divulgacão e na seleção do repertório, que tinha a idéia de fundir gothic rock com as coisas mais obscuras da cena eletrônica (como o industrial e o dark electro) com as vertentes do metal que se associam ao gótico”, diz ele.

Nesta edição, o público amante do som gótico ainda vai ter uma atração a mais: a banda paulista Dead Jump (veja mais logo abaixo) vem pela primeira vez ao sul do país, apresentando o seu novo álbum, Immortal.


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1) Banda paulista na Festa




A “animação” da quarta edição da Bela Lugosi is Dead ficará a cargo da banda paulista Dead Jump, que vem pela primeira vez ao sul do Brasil. A banda - que na verdade é de um homem só, Alexandre Ramos – é de Guarulhos, São Paulo, e faz um som na linha da Eletronic Body Music (EBM), algo como uma música eletrônica mais pesada e sombria. Estilo criado nos anos 80, o EBM flerta com o som industrial, e veio antes da chamada “popularização” da música eletrônica, que no início dos anos 90 colocou o techno, o trance e o drum'n'b ass nas pistas das raves que começavam a se espalhar mundo afora.

O responsável por trazer a banda para Santa Maria é Wandeclayt, que toca o mesmo EBM na sua banda, a Aire ‘n terre, e que também é o cara por trás dos sons da Fetish Fest, outra festa já tradicional na cidade. A Dead Jump vem a Santa Maria na tour de lançamento de seu quarto CD de estúdio, Immortal, que foi lançado pela gravadora Resistence beat e ganhou distribuição mundial. Quem quiser conhecer mais a banda ou escutar os sons pode acessar os sites www.deadjump.net ou www.myspace/deadjump.



2) “Bela Lugosi está morto”





Bela Lugosi is Dead” é o primeiro single da banda Bauhaus, lançado ainda em 1979 e considerada uma das primeiras músicas do gothic rock. O título da música faz referência à estrela dos filmes de terror da foto acima, Bela Lugosi (1882-1956), que praticamente definiu a imagem do vampiro no século XX com sua brilhante atuação em Drácula, filme de 1931 e considerado um dos grandes clássicos do gênero terror.

Muito da popularização da música, e da transformação dela em um “hino”gótico, se dá pelo seu uso no filme de 1983 “Fome de Viver”, dirigido pelo americano Tony Scott, do recente “Chamas da Vingança”. A história da película trata de um casal de vampiros (Catherine Deneuve e David Bowie) que, juntos há séculos, desperta curiosidade em uma jovem médica (Susan Sarandon), que fica “disposta” a estudar o misterioso comportamento – inclusive sexual - dos dois. A cena inicial do filme é clássica: o casal de vampiros sai a procura de carne humana em uma boate típica dos anos 80, enquanto que no alto-falante do local, “Bela Lugosi is Dead” anima a noite.

-Jornal A Razão, 23 de Novembro de 2006-


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11.21.2006

Os melhores álbuns do século XX

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* Abrindo um parêntese aqui no conteúdo "normal" do Cena...

Logo abaixo está a lista dos melhores álbuns do século XX.Produzida pela revista Rolling Stone americana, é provavelmente a mais "equilibrada" das listas que foram feitas por revistas e pessoas mundo afora.
Ainda assim, nesta se percebe nitidamente a preferência pelo rock'roll (basta ver os 10 melhores, por exemplo), o que está longe de ser um demérito; talvez o rock tenha realmente sido o movimento de maior expressão na música do século XX.



1.Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, The Beatles (1967)




2. Pet Sounds, The Beach Boys (1966)




3. Revolver, The Beatles (1966)




4. Highway 61 Revisited, Bob Dylan (1965)




5. Rubber Soul, The Beatles (1965)




6. What's Going On, Marvin Gaye (1971)




7. Exile on Main Street, The Rolling Stones (1972)




8. London Calling, The Clash (1979)




9. Blonde on Blonde, Bob Dylan (1966)



10. The Beatles ("The White Album"), The Beatles (1968)





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Comentários:

_ Quatro álbuns dos Beatles não deixam dúvida da alcunha " maior banda do século XX", ou qualquer outro "the best" que eles carregam.

_ Por esse mesmo critério, não há dúvidas também de que Bob Dylan é o "grande artista americano".

_ A ausência do Pink Floyd entre os 10 mais é um pouco estranha; porém, tente tirar algun destes e colocar "Dark Side of the Moon" ou "The Wall", por exemplo. É difícil; ainda assim, eu trocaria o Rubber Soul pelo Dark Side of the Moon. Mas é apenas a minha opinião.

_ Por ser uma revista americana, é até uma surpresa que entre os 10 mais estejam apenas 3 artistas/bandas americanos: Bob Dylan, Marvin Gaye e os Beach Boys. Os outros sete são britânicos, comprovando a supremacia quase unânime do rock britânico sobre o de qualquer outro lugar do planeta.

_ Entre esses 10, não há jazz nem blues; o primeiro artista de jazz da lista aparece no 12º lugar: Miles Davis. Fora o rock/pop e suas variações mais próximas como o folk e o punk, há ainda a soul music de Marvin Gaye.

_ Só um dentre os 10 não é do período que vai da metade da década de 1960 até o início da de 1970: London Calling, do Clash, que é de 1979. O ano mais privilegiado foi 1966, com três discos entre os 10, seguido de 1965 com dois. O final da década de 1960 até o início da 1970, devido a uma série de cirscunstãncias (inclusive históricas), é realmente o período mais criativo da música do século XX.

Continuando a lista até os 50:



11. The Sun Sessions, Elvis Presley (coletânea lançada em 1976)

12. Kind of Blue, Miles Davis (1959)

13. Velvet Underground and Nico, The Velvet Underground (1967)

14. Abbey Road, The Beatles (1969)

15. Are You Experienced?, The Jimi Hendrix Experience (1967)

16. Blood on the Tracks, Bob Dylan (1975)

17. Nevermind, Nirvana (1991)

18. Born to Run, Bruce Springsteen (1975)

19. Astral Weeks, Van Morrison (1968)

20. Thriller, Michael Jackson (1982)

21. The Great Twenty-Eight, Chuck Berry (coletânea lançada em 1982)

22. Plastic Ono Band, John Lennon (1970)

23. Innervisions, Stevie Wonder (1973)

24. Live at the Apollo, James Brown (1963)

25. Rumours, Fleetwood Mac (1977)

26. The Joshua Tree, U2 (1987)

27. King of the Delta Blues Singers, Vol. 1, Robert Johnson (coletânea lançada em 1996)


28. Who's Next, The Who (1971)

29. Led Zeppelin, Led Zeppelin (1969)

30. Blue, Joni Mitchell (1971)

31. Bringing It All Back Home, Bob Dylan (1965)

32. Let It Bleed, The Rolling Stones (1969)

33. Ramones, Ramones (1976)

34. Music From Big Pink, The Band (1968)

35. The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders From Mars, David Bowie (1972)

36. Tapestry, Carole King (1971)

37. Hotel California, The Eagles (1976)

38. The Anthology, 1947 - 1972, Muddy Waters (coletânea lançada em 2001)

39. Please Please Me, The Beatles (1963)

40. Forever Changes, Love (1967)

41. Never Mind the Bollocks, Here's the Sex Pistols, The Sex Pistols (1977)

42. The Doors, The Doors (1967)

43. The Dark Side of the Moon, Pink Floyd (1973)

44. Horses, Patti Smith (1975)

45. The Band, The Band (1969)

46. Legend, Bob Marley and the Wailers

47. A Love Supreme, John Coltrane (1964)

48. It Takes a Nation of Millions to Hold Us Back, Public Enemy (1988)

49. At Fillmore East, The Allman Brothers Band (1971)

50. Here's Little Richard, Little Richard (1957)



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11.17.2006

Review (5): O primeiro mosh a gente nunca esquece

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Dez de Novembro de 2006: data do provavelmente primeiro mosh da história do Macondo.


Na sexta-feira passada, no Macondo Bar, Santa Maria pode ver dois grandes nomes do cenário de bandas independentes do país; o primeiro com 13 anos de uma estrada que já percorreu praticamente todo o Brasil; o segundo, novato de apenas três anos de existência, percorrendo lugares desconhecidos com o vigor de um adolescente maravilhado por estar longe de casa. Walverdes e Zefirina Bomba se apresentaram na cidade mostrando mais uma vez que a distância geográfica e cultural que separa Santa Maria do centro do país pode ser muito menor do que se imagina.


Apesar da promessa de dois bons shows, o bar não estava cheio. em grande parte devido a concorrência feroz que são as boates com entrada gratuita para estudantes universitários na sexta-feira. Invertendo a ordem pré-combinada dos shows, a atração principal – pelo menos teoricamente, já que a grande maioria dos presentes estava ali para ver a outra banda - Zefirina Bomba entrou primeiro no palco. Ilson, Martin e Guga; bateria, baixo e uma viola de 12 cordas fazendo muito bem às vezes da guitarra, com distorção tamanha que só olhando para o instrumento se percebia que, realmente, não se tratava de uma guitarra.


A melhor definição para o som que a Zefirina faz é o punk-rock – na mais abrangente concepção do que pode vir a ser o punk-rock. Ora o show tinha momentos hardcore, ora era o Nirvana quem ali baixava, como na cover de “Aneurysm”, uma das mais pesadas e catárticas músicas da banda de Kurt Cobain. Os poucos presentes na linha de frente do palco pulavam e faziam uma esquálida roda-punk, que parecia estar em contato mental direto com o vocalista Ilson agitando sua cabeleira crespa e esquartejando, aos poucos, a sua viola envenenada.


Nem bem uma hora depois do início, o vocalista e violeiro (?) puxa os primeiros acordes de “Interestellar Overdrive”, canção instrumental da fase mais psicodélica do Pink Floyd. A banda o acompanha. Ilson então deixa sua viola de lado, encostada no amplificador, fazendo o tal barulho popularmente conhecido como microfonia. Ele então pega o microfone quase como um rapper, de lado, e “declama” alguns versos sob o fundo musical caótico. A roda punk da frente pára, observando; Ilson começa a fazer uns gestos para eles, como que pedindo para se juntarem. De início, ninguém parece entender; alguns segundos depois, o dito contato mental entre o público e o vocalista parece fazer efeito e a roda se junta.


Então, numa daquelas cenas que de tão improváveis parece só existir na televisão, o violeiro pula do palco em direção à roda, que o segura e depois, repetidas vezes, o joga para cima, como em uma comemoração de um time depois de ser campeão. Ilson ainda volta extasiado em direção ao palco para pegar sua viola e encerrar o show; o resto do público, incrédulo, não sabe se aplaude ou fica pensando se aquilo realmente aconteceu; na dúvida, o pessoal da roda punk puxa os aplausos.


Acabara de ocorrer ali , provavelmente, o primeiro mosh genuíno da história do Macondo; a mais sincera demonstração de comunhão banda-público encerra o show da Zefirina Bomba da melhor maneira que ninguém esperava ser possível.


E depois ainda ocorreu o show do Walverdes.

- Jornal A Razão, 16 de Novembro de 2006 (com modificações)-


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11.13.2006

Divagações sobre um mesmo álbum (1)

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Astral Weeks, Van Morrison






Van Morrison era jovem em 1968, ano de lançamento de "Astral Weeks": tinha 23 anos e estava ainda amargurado com o fim do Then, sua banda de blues/rock’roll junto de seus comparsas, irlandeses assim como ele. Já andava em carreira solo e também já tinha composto um de seus principais hits, “Brow eyed girl”, um ano antes, junto de mais 12 músicas presentes no seu primeiro álbum solo, Blowin' your mind . Mas na sua tão lancinante juventude, estava confuso, provavelmente por aquele que é o principal motivo de um homem estar confuso: divergências com a(s) mulher (es) amadas. E, como não poderia deixar de ser, a confusão – que quase de maneira inevitável traz o sofrimento e a amargura – o inspirou de tal forma que, em 48 horas, gravou as oito músicas de “Astral weeks”, em dezembro de 1968.


Talvez mais do que um disco, “Astral”, funciona como uma terapia, uma viagem às feridas abertas no interior de cada um. É como se fosse Van, diante de um espelho que mostra todas as coisas que o aflingiam, gritasse desesperadamente para achar uma saída, e, não encontrando nada melhor, resolvesse dar uma de kamikaze e entrasse no próprio espelho, para, chegando lá, se surpreender e ver que aquilo que o aflingia não pode ser curado nem compreendido por inteiro, seja lá qual for a força que ele suponha que o amor teria para achar a cura. O relato dessa viagem pelo espelho, e sua conseqüente redenção ao assumir a dor, seriam as oito músicas do álbum. Como poucos, o irlandês não grita, nem berra; uiva os seus lamentos, tornando cada canção uma história de confissão que parece não cansar, tal é a sinceridade com que ele emprega em cada verso. Sua voz é imponente como dos grandes cantores de blues e R&B, mas carregada de emoção como nos bons vocalistas de rock e guia de cada uma das faixas do disco, deixando a parte instrumental, predominantemente acústica ou feita por instrumentos de sopro, como um limpa-trilho que abre passagem para o vozeirão de Van invadir cenários e pessoas diferentes – quando, por vezes, o mesmo não arranca primeiro e destrói tudo pela frente, restando para a parte instrumental a ingrata tarefa de avisar aos destroçados que aquilo trata-se de apenas uma canção.


A primeira música do álbum, nomeada como o disco, começa já apresentando a questão que o cantor se pergunta na primeira vez que adentra o seu espelho:

“Se eu me aventurasse no turbilhão da hélice, entre os viadutos dos teus sonhos, onde racham os aros de aço móveis e o fosso e as ruelas acabam, você poderia me achar, você beijaria os meus olhos e me deitaria em tranqüilo silêncio para nascer de novo?”

Provavelmente de forma inconsciente, porque o irlandês dizia que não pensava (e nem teria como) em todos os significados que as suas letras despertavam nas pessoas, ele acabou já de cara fazendo a pergunta a qual não teria como encontrar resposta, porque de alguma forma, nestes casos, a resposta não vem nunca quando se pergunta, mas por livre e espontânea vontade de aparecer e dar o seu ar da graça quando menos se espera – o que é, ao natural, a melhor forma de receber uma recompensa de quando se pergunta algo às diferentes formas imbuídas no amor.



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Divagações sobre um mesmo álbum (ou música, dependendo) vai ser uma "série" exatamente da forma com que o título a apresenta: divagações - um pouco diferente de "viagens", mas não me pergunte qual é a diferença - sobre um álbum, uma música.
Para ilustrar, sempre vai vir acompanhado do objeto divagado em mp3, para que todos também possam divagar juntos e buscar uma relação - provavelmente obscura, mas sempre existente - entre as diferentes imagens e idéias criadas e/ou proporcionadas pela audição do álbum/música.

Para começo de conversa, ai vão algumas músicas do "Astral Weeks", provavelmente as melhores:

1 - Astral Weeks: uma quase perfeita síntese do que é o álbum

4 - Cyprus Avenue : a mais conhecida do disco, um longo "passeio" na avenida do título.

6 - Madame George: nas palavras do clássico crítico americano, Lester Bangs:
"Madame George é o redemoinho do álbum. Possivelmente uma das mais compassivas obras musicais já feita ela monta a cena para que assistamos ao calvário de um travesti abandonado com uma simpatia tão intensa que, quando o cantor o machuca, nós também o fazemos."


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Para finalizar, aí vão outras palavras de Lester Bangs, divagando também:
"Mas o lindo horror de "Madame George" e "Cyprus Avenue" é precisamente que as pessoas não estão morrendo: estamos vendo a vida em seu primor, e essas pessoas não estão sofrendo de doença, estão sofrendo da natureza - a não ser que a natureza seja uma doença."

Ah: quem quiser baixar o álbum inteiro aqui pode entrar aqui também.


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11.09.2006

Reportagem (12): Barulheira das boas aterrisa em Santa Maria

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Duas das mais destacadas bandas do cenário independente brasileiro tocam amanhã no Macondo: Zefirina Bomba e Walverdes



Santa Maria pode dizer, com uma ponta de orgulho e outra um tanto de surpresa, que virou passagem quase obrigatória para qualquer tour pelo Estado de bandas independentes do cenário nacional. Depois de receber bons nomes do rock mais “alternativo” como Autoramas, Pata de Elefante, Superguidis e Júpiter Maçã, amanhã é a vez do Macondo ser palco para outras duas bandas independentes: os gaúchos do Walverdes e os paraibanos do Zefirina Bomba. Os primeiros, velhos conhecidos do público local, vem à cidade mostrar o seu eficiente rock garageiro – barulhento, supersônico, punk e grunge, tudo ao mesmo tempo; já os paraibanos, um inusitado power-trio de baixo, bateria e viola amplificada, tocam pela primeira vez em Santa Maria, apresentando o álbum que no nome já apresenta o som da banda: Noisecoregroovecocoenvenenado


É mais uma chance dos santa-marienses conhecerem boas bandas que não tocam nas “rádios pop” locais. Uma rápida olhada para trás já é suficiente para valorizar ainda mais o atual momento de shows por aqui; a bem pouco, bandas de fora do RS tocavam na cidade em pequenas doses, duas ou três vezes por ano, em eventos especiais particulares ou em festas promovidas por uma rádio local. Ainda sim, os nomes que vinham se apresentar, se não eram ruins, também não eram nenhuma novidade para um público criado ouvindo rádio FM e MTV. Hoje em dia isso mudou: a cidade deixou de receber os mesmos medalhões do rock dos anos 80 e as “novidades” patrocinadas pelas rádios para recepcionar bandas novas, inovadoras, que fogem do esquema da concessão obrigatória para fazer sucesso.


O cartaz dos shows da tour do Zefirina Bomba pelo estado


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Zefirina Bomba




Imagine um power-trio no mínimo estranho - baixo, bateria e uma viola com distorção ligada num amplificador - composto por um pernambucano, um paulista e um paraibano loucos por Stooges, Cascavalletes, Beatles, punk-rock e o poeta João Cabral de Melo Neto. Numa definição das mais simplistas, essa seria a Zefirina Bomba, formada em 2003 em João Pessoa, Paraíba, por Ilson (vocal e viola), Martin (baixo) e Guga (bateria).
_ Quando a gente se juntou pra tocar a idéia era experimentação com distorção, e desde então é isso que a gente tenta fazer, sem concessão - diz Ilson.

Depois de uma primeira demo gravada, o Zefirina começou a aparecer em todo o país com performances ensandecidas em shows de importantes festivais como o Abril Pró Rock e o Mada (Música Alimento da alma). No final de cada um, ao melhor estilo Nirvana e The Who, o vocalista despedaçava sua viola junto aos outros equipamentos.

No início deste ano, os três integrantes entraram em estúdio para gravar o primeiro álbum, produzido pelo conhecido Carlos Eduardo Miranda, descobridor dos Raimundos e também um dos jurados do programa “Ídolos”, do SBT. Lançado pelo selo da Trama, o “Noisecoregroovecocoenvenenado” vem chamando atenção pelo som inusitado: é pop e também é rock; é punk mas também pós-punk, é tosco e também sincero e despretensioso.
_ O nome do álbum é a nossa cara!- diz o vocalista.

Se alguém chegou até aqui e ainda não entendeu o porquê do nome da banda, aí vai a explicação de Ilson:
_ Zeferina era a lavadeira lá de casa, eu a chamava de zefinha bomba, por conta do barulho que ela fazia lavando roupa, quando tirava o sabão do lençol batendo no esfregador. Eu já me divertia com barulho desde pequeno!.
Quem quiser se antecipar ao show e já chegar lá cantando as músicas pode escutar no site da banda no Tramavirtual

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Walverdes




_ Foi um bom show, mas esperamos fazer um ainda melhor dessa vez.
As palavras são de Gustavo "Mini" Bittencounrt, vocalista e guitarrista do Walverdes, sobre a última vez que a banda passou pela cidade, a cerca de quatro meses atrás, no mesmo palco onde vão tocar amanhã.
_ Eu achei o Macondo um lugar muito especial, toca bom som, reúne a galera legal da cidade. O ideal é que sempre tenha um "Macondo" em cada cidade. São os melhores lugares pra se tocar - completa.

Veteranos da cena underground gaúcha e nacional, o Walverdes está tendo um excelente ano de 2006; além da boa repercussão em todo o país do segundo álbum da banda (tirando inúmeros Eps e demos) “Playback”, lançado de forma independente pelo selo Mondo 77, o videoclipe de “Seja mais certo” foi indicado a melhor clipe independente no Vídeo Music Brasil, o tradicional VMB, organizado pela MTV. Mesmo não ganhando o prêmio, fizeram bons contatos e divulgaram ainda mais a banda, que hoje é uma das mais respeitadas do país, principalmente por músicos e amantes de uma boa barulheira de grupos como Nirvana, Mudhoney, Ramones, Sonic Youth, Sonics e The Who, dentre outros.

A banda, completada por Patrick Magalhães (baixo) e Marcos Rubenich (bateria), prepara um repertório levemente diferente do último show em Santa Maria.
_ Trocamos de ordem algumas músicas, colocamos uma diferente também. Provavelmente o show vai ser mais curto, pois a banda principal é o Zefirina - diz Mini.
O contato para a tour junto com a Zefirina Bomba ocorreu através da produtora Roque Town, que convidou os gaúchos para participarem de três dos quatro shows que os paraibanos vão fazer por aqui.
_ Ainda não conheço os caras pessoalmente, mas achei o disco deles muito bom, tosco no melhor dos sentidos - completa Mini.

Site oficial: Walverdes.com


-Jornal A Razão, 9 de novembro de 2006 (modificado)-


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11.06.2006

Review (4): "Você sabe sim", Crema

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Para quem não lembra, a Crema foi a primeira banda a aparecer aqui no Cenabeatnik, no já longínquo post de 2 de julho deste ano. Naquela época, cerca de dois meses deles terem feito apenas o primeiro show, a banda era pouquíssimo conhecida pela cidade – ainda assim, esses que conheciam já a consideravam bastante promissora, para dizer o mínimo. Passados quatro meses e alguns quantos shows, eles vão lançar, neste sábado no Macondo Bar, o primeiro single, “Você sabe sim” , música composta pelo vocalista, tecladista e eventual guitarrista Márcio Gomes.


Para os que não conhecem o som da banda, uma audição sem compromisso da música lembrará inevitavelmente o Coldplay – para bem ou para mal, hoje em dia qualquer rock/pop com teclado lembra a banda britânica. Mas já na segunda ou na terceira escutada se percebe que o som é mais rock’roll, e a letra, num tom reflexivo e invocativo como o dos clássicos comerciais da MTV, é talvez o maior exemplo da verve roqueira da banda, mais até do que a guitarra distorcida tocada por Cauã Johnsons, que ganha um bom destaque nos solos depois de cada refrão. Por mais simples que pareçam os versos (“Você sabe sim o que pode fazer para mudar/você sabe sim desculpas não vão te ajudar) ainda assim eles atingem o objetivo de, pelo menos, fazer com que se preste atenção na letra – mesmo que ela possa até não dizer nada para alguém, ela passa uma mensagem que é percebida facilmente por quem quiser prestar mais atenção e refletir sobre aquilo que é cantado.


É notável também que a Crema, nestes poucos meses de vida, já adquiriu entrosamento que muitas outras bandas em mais tempo não atingiram, o que faz dela, hoje, uma das mais interessantes de Santa Maria, cidade tão dividida em pólos que nunca parecem querer se misturar. É daí também que vem o maior mérito da banda: buscar, até de forma inconsciente, unir o “lado b”, nunca indulgente com as atividades de seus membros e sempre alternativo a tudo que pode ser considerado “pop”, com o “lado a”, radiofônico, pop sem vergonha de o ser, mas talvez por isso burro, sem cérebro e muito menos culhões necessários para passar qualquer mensagem que não seja a mais simples possível. Por não ter vergonha de pinçar algumas músicas do repertório em bandas boas não tão conhecidas e, principalmente, por fazer uma música assumidamente pop – ou rock - sem concessões que muitas bandas acham inevitável é que a Crema se sustenta e hoje sobrevive bem, obrigado.


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Comunidade da banda no orkut



Baixe a música aqui .



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Justificativa

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Não que precise explicações, mas a justificativa pela ausência de posts novos durante cerca de uma semana no blog é devido a uma viagem do blogueiro, que esquecendo de avisar antes, o faz agora.
As atividades agora voltarão ao normal, sem expectativa de ausências por um bom tempo, quiçá até o fim deste ano.


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10.28.2006

Castelhanos melódicos (2)

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O Callejeros tenta se reerguer depois de ser protagonista de uma das maiores tragédias da história do rock argentino



Noite de 30 de dezembro de 2004, Buenos Aires, Argentina. Para comemorar o seu excelente ano, a banda de rock Callejeros, que ainda colhia os louros do sucesso do seu terceiro disco, Rocanroles sem destino, organiza um show na conhecida boate República Cromañon. O público lota o local, quatro mil pessoas na expectativa de ver uma banda que há menos de seis meses tocava para pequenas platéias e hoje lota estádios para 15 mil pessoas. Envolto de um aparato pirotécnico com fogos de artifícios e muitas luzes, o Callejeros adentra ao palco. Os gritos de delírio dos fãs não chegam a ter como resposta a música da banda, porque antes disso um dos foguetes lançados atinge o teto da boate, que pega fogo, desaba e corta a energia elétrica de todo o local. As saídas de emergência não funcionam como deveriam, as quatro mil pessoas espremidas não conseguem se mover direito, o resgate demora a chegar. Algumas horas depois, começa a inevitável contagem dos mortos e feridos: 193 mortos, e mais outros tantos feridos.


Um dos inúmeros protestos dos parentes das vítimas do incêndio em Cromañon, que matou 193 pessoas


Por motivos nada musicais, o Callejeros se torna capa das principais revistas e jornais argentinos; alguns acusam a banda de irresponsabilidade, outros acusam os donos da boate de negligência, já que há muito tempo o local apresentava diversas falhas na parte da segurança. Em meio a depoimentos e esclarecimentos, e ainda sendo alvos da ira dos pais das vítimas, os integrantes da banda não tem outra solução se não a de dar um tempo.



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Corta para este ano, mais precisamente na primeira metade dele. Ainda sendo investigados como cúmplices das mortes pela justiça argentina, o grupo decide voltar. Sem alarde, lança o quarto álbum, “Señales” , na mesma linha de antes (uma mistura bem sucedida do rock’roll tradicional com o ska e o pop) e aos poucos prepara a sua volta. Em 21 de setembro deste ano, organizam o primeiro show oficial depois da tragédia de Cromañon num estádio de Córdoba, região central da Argentina. Vinte mil pessoas vão ao estádio, e dessa vez o show é tranqüilo, sem pirotecnia, e com os sobreviventes da tragédia em lugares gratuitos, na frente do palco.Seria mais fácil – e ao mesmo tempo deprimente – uma banda de qualidade acabar em depois de uma tragédia, mas não é o que Christián Torrejón (baixo) Eduardo Vazquez (bateria), Elio Delgado (guitarra), Juan Carbone (sax), Maximiliano Djerfy (guitarra e vocais) e Pato Fontanet (vocal), os seis integrantes do Callejeros quiseram.





Quatro dos seis Callejeros em atividade, no show da volta da banda, em Córdoba, no final de setembro.



- Jornal A Razão, 26 de Outubro de 2006 -




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Quem quiser conhecer um pouco mais da banda pode acessar o site oficial . Ou então ver o clipe de "uma Nueva noche fria", talvez o maior hit dos Callejeros.


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10.26.2006

Notas(5): Novidades na programação radiofônica da cidade

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Boa parte da juventude de Santa Maria que escuta seguidamente rádios sente falta de um programa musical realmente de qualidade, que também passe informações e, principalmente, não trate o ouvinte com gírias modernosas e imbecilizantes. A Rádio Universidade (800 AM), de uns tempos pra cá, vem sendo a única a tentar reverter esse caminho, mesmo que seja em esparsos programas como por exemplo o “Atitude Rock”, comandado pelo jornalista Homero Pivotto Júnior, no ar toda quarta-feira das 21h às 23h.
Uma outra opção que surgiu recentemente (precisamente um mês atrás) é o programa Pró-Música, produzido e apresentado pelos estudantes de jornalismo da UFSM Raero Monteiro, William Araújo e Jefferson Dornelles, que vai ao também nas quartas, logo depois do Atitude Rock, das 23 às 24h.


Apaixonados por música e rádio, os três estudantes abordam em cada programa um estilo musical, trazendo informações, entrevistas e, obviamente, muita música. No de ontem, foi a vez do Manguebeat, e a entrevista foi com o vocalista e líder do Mundo Livre S.A, Fred Zero Quatro.
Na semana que vem, o pessoal falará sobre o samba-canção, contando com a presença (pelo telefone) dos saudosos Cauby Peixoto e Agnaldo Rayol. Quem não puder acessar a rádio no horário do programa pode fazer o download dos arquivos completos no blog www.promusica800am.blogspot.com, que também funciona como o canal de comunicação com os três estudantes. Também dá para achá-los no Orkut, na comunidade “Pró-Música”.


- Jornal A Razão, 26 de Outubro de 2006-



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10.23.2006

Review (3): I Want it Loud!

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Coletânea de 12 nomes do rock independente mostra o que todo mundo já sabia: se o mainstream brasileiro anda cada vez pior, o circuito independente é cada vez melhor



Wonkavision, Netunos, Nervoso e os Calmantes, Canastra, Eddie, The Feitos e Nelson e os Gonçalves são nomes relativamente conhecidos no underground nacional. Poderiam tocar em rádios pop, ter discos em lojas conhecidas, fazer shows nos mais variados lugares do país - enfim, deixar de ser conhecidos apenas pelo "mundinho" alternativo - se o nosso mainstream não fosse tão pobre, sempre à procura do próximo fantoche de cara bonita a ser manipulado e que se adeque a maquininha de músicas pré-programadas que toda grande gravadora parece ter. Enquanto isso não acontece (e sabe-se lá se esse futuro deixará de ser uma utopia algum dia), o que resta a essas bandas é se juntar, dividir os custos e gravar uma coletânea da melhor qualidade.

O disco começa com os gaúchos do Wonkavision, que fazem um power-pop na melhor linha dos britânicos Teenage Fanclub e dos grandes pais do estilo, o Big Star, de Alex Chilton. Seguem depois o rock'roll sessentista e jovem-guardista dos Netunos, com a bela faixa "Nosso dia" (que lembra bastante a finada Video Hits), os cariocas do Nervoso e os Calmantes e a deliciosa "Candidato a amigo", que conseguem a proeza de fazer um som de teclado de churrascaria casar perfeitamente com a letra assumidamente cafona.





O Canastra vem com "Diabo apaixonado", um rock/surf music pra lá de dançante, com umas pitadas do jazz Dixieland, um dos primeiros estilos musicais surgidos neste século e influência assumida do grupo. A quarta faixa é de Maurício Negão, "Madalena", um pouco mais rock que as anteriores, mas ainda com um espírito divertido e irônico, que parecem ser a tônica de todo o álbum. Os pernambucanos do Eddie, veteranos na cena alternativa nordestina, trazem o único samba do disco (e uma das melhores faixas da coletânea), "Pode me chamar", um samba que consegue ser moderno e clássico ao mesmo tempo, sem prejuízos de nenhum dos lados. Os cariocas do The Feitos vem com o pujante rock'roll "Pombas" , do divertido refrão " Ela me falou pra não largá-la, mas eu não me liguei por não amá-la, então ela fez macumba/ a vida não podia estar pior". Fechando o disco vem a faixa mais estranha, o eletro-rock "Viciado em Rock and Roll" , do Taw, outra banda carioca.

Organizada pela finada revista de quadrinhos Mosh! e pelo pessoal da tradicional festa carioca "Loud", o belo encarte do disco ainda consegue reunir o melhor dos dois mundos: tem 5 histórias em quadrinhos que tem como cenário a festa Loud!



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Quem quiser conhecer mais as bandas, ou escutar algumas músicas de cada uma, pode acessar os sites (oficiais ou não) das bandas:

Eddie
Wonkavision
Nervoso e os Calmantes
Canastra
The Feitos
Nelson e os Gonçalves

Ou então a parte do site da gravadroa Rastropop que fala do disco.



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10.19.2006

Ô coisa boa!

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Chegou por aqui a Rolling Stone Brasil.

Muitas páginas, muitos textos legais, muitas fotos, muitas resenhas, muita música (mas também política, moda, cinema...). Não lembro quando pensei no "o que vou fazer quando crescer" e escolhi jornalismo, mas tenho convicção que a Rolling Stone - e o filme Quase Famosos, que me apresentou à revista - tem alguma parte de culpa por isso.

E a Rolling Stone Brasil é tudo aquilo que se espera: tem muito jornalismo literário (por vezes, até demais), grandes entrevistas (Bob Dylan, Jack Nicholson - que é autor de uma já clássica frase: "Minha reação ao 11 de setembro foi a seguinte: vou passar um tempo fazendo comédias" - e , acima de tudo, personalidade, opinião própria, ousadia, algo que anda em falta por aqui. E vem com adesivos ainda.

Comprem, porque é o que diz o lendário editor da revista, Jan Winner: "opinião é o que importa, filho".



p.S: Desculpa a empolgação, mas é difícil segurar...



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10.17.2006

Os castelhanos e suas belas melodias (e letras)

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É sabido que, infelizmente, o brasileiro médio conhece muito pouco do rock argentino. Não tão sabido é que o argentino - e o uruguaio, chileno, colombiano... - conhece o nosso rock e a nossa música em geral muito mais do que conhecemos a deles. A ponto de novo álbum do Chico Buarque ter uma resenha na edição deste mês da Rolling Stone Latino América. Tudo bem, Chico Buarque é quase uma unanimidade por aqui, e em toda a América Latina são poucas as unanimidades no mundo da música. Mas o que faz a diferença é o tom da resenha, que trata o novo álbum do artista, Carioca, como um "velho conhecido", usando termos e informações que muitos de nós brasileiros nem sabemos - e olha que o Chico constanstemente é citado como o "maior" brasileiro vivo, o "grande artista nacional", entre outros exageros (?) que usam para designar o compositor.


Outro exemplo: o Los Hermanos recentemente esteve fazendo show em Buenos Aires. No dia do show, quinta-feira 5 de outubro, saiu uma bela matéria sobre a banda no Clarín, o mais vendido jornal argentino. Bela matéria mesmo, explicativa, contando toda a história da banda até então, desde as polêmicas com "Anna Júlia" até o recente álbum, 4. Quando que se viu algo desse tipo sobre uma banda argentina em qualquer jornal brasileiro? Pelo menos aqui no sul, há algum tempo que rock argentino - e castelhano, por tabela - é o Fito Paez, e, em menor escala, o Charly García . (Esses dois são monstros sagrados na Argentina, desde o final dos anos 70 e início dos 80 na ativa). Só duns tempos pra cá que o Jorge Drexler, que é mais próximo da nossa mpb que do rock, vem ganhando algum destaque por aqui - mas, convém realçar, que esse destaque é mundial, e ele só ganhou espaço no Brasil porque ganhou espaço no mundo inteiro também.







Mas, enfim, essa é apenas a introdução, o assunto principal é a banda argentina Estelares. Formada no início da década de 90 pelos platenses (da cidade de La Plata, perto de Buenos Aires) Manuel Moretti (guitarra, voz e a maioria das composições) e Víctor Bertamoni (guitarra), os Estalares pertencem a uma tradição bastante forte na Argentina, o rock de guitarras possantes, melodías pop e letras de amores perdidos/conquistados. Algo como o power-pop - de bandas como Big Star e a sua afiliada mais direta, a escocesa Teenage Fanclub -, onde as melodias parecem sempre querer ficar na cabeça de quem escuta. É um "estilo" que teve como grande expoente os Beatles em sua fase inicial, 63-66, onde as letras versavam exclusivamente sobre o amor, e as melodias eram, na falta de termo melhor, o epíteto do "pop" - belas, grudentas, bem feitas, guitarras, bateria, baixo e principalmente vocais harmoniosamente encaixados de modo a provocar um bem-estar em quem escuta.


Os Estelares se filiam a essa tradição com louvor, mas também, como argentinos que são, vão além, misturando influências dos grandes poetas tangueiros nas letras, que por vezes lembram narrativas boemias de um beatnik apaixonado. No quarto álbum da banda, o recém-lançado Sistema Nervioso Central, o vocalista Moretti abusa da primeira pessoa, por vezes até se citando nas canções, como em "Ella dijo", que conta a história de uma mulher que só quer ir para cama com o vocalista, e nada mais que isso. A letra, auxiliada pela bela melodia levada no violão, funciona como um conto de amor nos tempos modernos, onde Moretti explode - vagarosamente, diga-se - no refrão cantando, agora em 3º pessoa, "eu disse que tu não és o meu amor", como se fizesse um desabafo depois de um bom tempo de conversa recheada de uma absurda tensão sexual.


Outra canção marcante do disco é "Um día perfecto". Como nos melhores momentos das melodias power-pop, ela anima, dá esperança até mesmo para aquele depressivo no mais melancólico dos dias - ou, então, cria esperança mesmo para o sujeito depois de mais um fora da sua tão amada e desejada musa.

Em "El corazón sobre tudo", a letra é tão romântica que, para nós brasileiros, destoa para o brega. Não que isso seja um problema: mesmo por aqui, os retratos mais fiéis dos apaixonados talvez tenham sido produzidos pelos compositores da dita canção popular, ou brega até: Roberto e Erasmo Carlos, Odair José, Bruno e Marrone, dentre outros. Nada mais natural, pois as situações de desencontros amorosos acontecem em um ambiente imerso de referências ao brega, e o exagero, que talvez seja uma das principais características do estilo, ganha ares de normalidade nestes casos.


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Para escutar algumas músicas dos outros discos da banda, entre no site da banda.


Ou então baixe as três abaixo:

"Ardimos"

"Un día perfecto"

"Ella dijo".



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10.13.2006

Notas (4)

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Boate do DCE aos sábados



A tradicional boate do DCE, que costuma rolar toda a sexta-feira, está atualmente fechada devido ao período de férias do pessoal da graduação da UFSM. Ainda assim, nos sábados o local vem sendo sede de alguns eventos especiais, que nada tem a ver com a organização da boate. Um desses eventos foi o Ocidente Hard Festival, que aconteceu no dia 23 de setembro. Promovido pelo pessoal do programa Pantha Rei - que mistura filosofia, música e poesia e está a mais de três anos no ar na Rádio Universidade –, o festival contou com a participação das bandas Hard West, Galaxie Blue e Scarpast, de Santa Maria, e mais a Elite Rock Band, de São Pedro, e a Infinity, de Ibirubá.

Mesmo sendo num sábado, a boate praticamente lotou, não ficando atrás do que normalmente acontece nas sextas-feiras, quando a boate é organizada pela entidade estudantil. Um desavisado que não soubesse que a UFSM está em férias e entrasse na boate poderia até achar que fosse uma sexta-feira tradicional, se não fosse um detalhe: o público. Talvez tenha sido a maior concentração de camisetas pretas e cabelos longos em muito tempo em Santa Maria.





O próximo evento especial de sábado na boate está marcado para amanhã, e promete igualmente uma reunião de camisetas pretas e cabeludos: o Obscure Faith Festival II. Auto-intitulado o “maior evento de metal extremo do estado”, o festival contará com apresentações das bandas santa-marienses Soul’s Gallery (death metal) e Envoutment (black metal) e mais quatro outras do Estado: Tiwaz (black metal), Hateworks (death metal), Mental Horror (death metal) e Pilatus (black metal). Os ingressos custam R$ 7,00 antecipado na Exclusive discos e R$10,00 na hora. Estudantes universitários com carterinha não pagam nada. Mais informações sobre o festival com o Zé, que é quem está organizando o evento, pelo telefone 81117152 ou o email thesorrowsoul@gmail.com. A foto acima é a do belo cartaz do festival.


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10.05.2006

Rock sem frescura

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A Los Vatos, banda porto-alegrense de rock-punk, toca amanhã em Santa Maria junto dos locais da Three Little Pigs


A melhor frase para definir o som da banda Los Vatos é uma que eles mesmos criaram: “A atitude é punk, o rock é básico”. Criado em 1998, a banda vem amanhã à Santa Maria lançar o segundo Cd oficial e o primeiro DVD ao vivo, gravado no ano passado no histórico bar Garagem Hermética, em Porto Alegre. O show vai rolar no Macondo bar, e também terá a presença da Three Little Pigs, banda de hardcore daqui de Santa Maria.

Formada por Nery (baixo e vocal), Sérgio (guitarra) e Luiz (bateria), a Los Vatos é conhecida no país por suas apresentações explosivas e cheias de vigor, sendo que no último Ruído Festival, um dos festivais mais importantes do underground nacional, a revista de música Dynamite considerou o show da banda como um dos melhores do festival. O som da banda é um rock’roll básico, beirando o punk rock e o hardcore, com letras simples e diretas, tudo sem muita frescura, rápido e rasteiro. Quem quiser conhecer mais a banda pode acessar o site deles, www.losvatos.com.br, e o www.tramavirtual/losvatos. Nos dois dá para escutar músicas da banda.

Abaixo o cartaz dos shows:






- Jornal A Razão, 5 de outubro de 2006 -

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9.29.2006

Reportagem (11): A última grande revolução no rock

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Há 15 anos atrás, em setembro de 1991, o Nirvana lançava o seu segundo álbum, “Nevermind”. Ninguém imaginava a revolução que ele causaria.


Uma revolução, pelo menos na música e talvez também na cultura pop, nunca é realmente percebida quando está acontecendo. No caso específico da música, quando um álbum é “inovador”, “original” para a época, uns poucos gatos pingados escutam, e a maioria desses ainda não percebem o potencial explosivo do que estão escutando. É preciso tempo – dias, semanas, meses, por vezes até anos – para assimilar o impacto, porque se ele é realmente inovador, não vai haver nada, pelo menos naquela época, que sirva de base de comparação para uma definição qualquer. No máximo pode haver, entre uns poucos mais rodados de bagagem musical, uma sensação de que “algo está acontecendo”.

Há quase exatos 15 anos atrás, em 24 de setembro de 91, esse “algo está acontecendo” foi sentido pela ultima vez na história da música pop. “Nevermind”, o segundo álbum do Nirvana, chegava às lojas de todo o planeta embalado pelo explosivo clipe de “Smells like teen spirit”, o primeiro single do disco. Em pouco tempo, a gurizada roqueira – que na época era maioria em praticamente todo o planeta – começou a trocar os excessos do hard rock farofa de bandas como Poison, Motley Crue, Guns’n’Roses, pela simplicidade e sinceridade da música feita por apenas três caras, liderados por um jovem loiro do interior dos Estados Unidos, que se vestia de xadrez porque os trabalhadores da sua região assim se vestiam, e – suprema inocência! – tocava poucos e barulhentos acordes porque era assim que sabia fazer. Alguns meses depois de lançado, mais precisamente em janeiro de 92, “Nevermind” já destronava o então rei do pop Michael Jackson do primeiro lugar da Billboard, a mais famosa das listas dos álbuns mais vendidos do planeta, e Kurt Cobain, o tal jovem loiro, era o rock star mais amado do mundo.

Hoje em dia, quem escuta o álbum pode até se perguntar “mas o que tem de inovador nisso?”. Na época, misturar guitarras barulhentas – nem tão rápidas quanto às do punk rock, nem tão pesadas quanto às do heavy metal – com melodias pop era algo bastante inovador e original. Mas, talvez, o que tenha marcado mesmo o Nirvana tenha sido a atitude da banda: quem estava ali eram três pessoas normais, que falavam e faziam as mesmas coisas que todo mundo, que não eram fabricados por empresários e produtores nem forçavam a barra como os posers do hard rock. Era o retrato fiel de toda uma juventude que acompanhava de perto o tal mundo pop, mas nunca se via lá.

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A capa clássica




A capa do Nevermind é uma das mais conhecidas da história do rock. A idéia inicial bolada por Kurt Cobain era a de estampar no disco a foto de um bebê nascendo na água. Como era muito caro comprar uma foto desse jeito, decidiram contratar um fotógrafo, Kirk Weddle, que para realizar pelo menos uma parte da idéia de Kurt pediu para retratar o filho pequeno de um casal de amigos. Então, mesmo sem ganhar nada, Spencer Welden, na época com 4 meses, foi fotografado nadando em direção a uma nota de um dólar; sem querer, o bebê acabou se tornando um símbolo de toda uma geração. Tempos depois, o Nirvana ainda retribuiu seu “modelo infantil” com uma cópia em platina de “Nevermind”. A revista Rolling Stone, no aniverário de 10 anos do álbum, pegou o mesmo Spencer e repetiu a foto, desta vez com o guri nadando em direção a uma nota de dez dólares. Uma sátira da capa famosa também foi feita pela Rolling Stone, dessa vez usando Bart Simpson como o bebê (foto).


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As primeiras críticas de Nevermind:

Duas das primeiras críticas publicadas na grande mídia: a primeira é de novembro de 1991, da edição 618 da Revista Rolling Stone, escrita pelo jornalista Ira Robbins; a segunda é a primeira publicada no Brasil, escrita por André Forastieri para a revista Bizz n º 80, de março de 1992. Veja alguns trechos da crítica do americano (1) e a íntegra da do brasileiro (2):


1)
“Liderados pelo vocalista e guitarrista Kurt Cobain, o Nirvana é a última das bandas surgidas no underground que vem testar o grande público para o rock alternativo. Devido a rigidez da porção das pessoas que desfrutam do rock de guitarras que não é o heavy metal, a versão da verdade do trio do estado de Washington é, provavelmente, tão crível quanto qualquer outra. Uma dinâmica mescla de power chords, energia frenética e sobriedade sonora, o Nirvana ergue sólidas estruturas melódicas - rock que gruda no ouvido, cujos expoentes principais são o Replacements, Pixies e Sonic Youth - e logo as trata de demolir com gritos desaforados e caóticas explosões guitarrísticas. Quando Cobain decide ser punk - e sua voz é um instrumento muito versátil para isso - deixando de acariciar a melodia para raspar com a força de gritos por vezes deslocados, o baixista Krist Novoselic e o baterista Dave Grohl entram para manter a canção equilibrada, evitando que ela não se desintegre de modo caótico. Mesmo que o Nirvana não esteja fazendo nada de verdadeiramente novo, “Nevermind” tem as canções, o caráter e o espírito para ser muito mais do que uma mera reformulação dos hits oitentistas do rock universitário americano. (...)

Contendo alguns ocasionais (e provavelmente intencionais) erros de gravação, a maioria das canções (como “On a plain, “Come as you are” e Territorial Pissings”) mostram a habilidade da banda em introduzir a sutileza em um contexto denso e barulhento. Num outro extremo do disco, “Something in the way” flutua numa nuvem translúcida de guitarras acúsitcas e violoncelo, enquanto “Breed” e “Stay Away” são puro barulho; esta última, ainda, termina com uma impactante explosão sonora. (..)
Frequentemente, as bandas do underground gastam seus esforços em discos que não estão preparadas para fazer, e logo dilapidam suas forças e inspiração em árduas turnês. “Nevermind” põe o Nirvana numa encruzilhada: são operários gladiadores do rock garageiro que põem seus olhos em uma terra de gigantes. “


-Ira Robbins, novembro de 1991-



2)
"Esses caras vão nos enriquecer." Bruce Pavitt, dono da gravadora Sub Pop, sobre o Nirvana. Na BIZZ 6O, junho de 90.

Ou seja: o fato do Nirvana ter vendido mais de 2,5 milhões de cópias só nos EUA e desbancado Michael Jackson do alto da Billboard não deve surpreender você, velho leitor de BIZZ. Como diz aquele slogan da nossa colega corporativa/concorrente eletrônica, você viu antes aqui.

Mas as vendas que se danem. A questão fundamental é, como sempre: vale a pena desembolsar aquela suada bufunfa para comprar Nevermind?

Se você gosta de Pixies ou Damned ou Stooges ou Kinks/Who ou Gang Of Four fase Entertainment! ou Mudhoney ou rock de garagem sessentista ou qualquer tipo de hard rock áspero, puto e sem polimento, vale. Principalmente, se você gosta de punk californiano politizado, vale a pena. Vale vale vale. Compre três, dê um para o seu amor e outro para o seu melhor amigo.

OK, segunda questão - e aí é papo de jornalista, de gente que está tentando entender o que se passa no universo adjacente e não se limita a curtir as coisas (não que só curtir seja limitante, mas compreender é o nosso emprego e a nossa obsessão - ou pelo menos deveria ser). Pergunta 2: que significa a velocidade warp com que o Nirvana saiu dos cafundós do estado de Washington para os corações, as mentes e os toca-discos do público americano, quiçá mundial?

Significa que punk's not dead, oba! Quinze anos depois, os espertos da nova geração assumiram o punk como sua melhor representação musical. É, o Nirvana é punk, sim, punk paca - ainda que seu vocalista-letrista-guitarrista Kurt Cobain, 24, seja muito novo para ter curtido punk na época.

E punk não só na avalanche animalesca de distorção e hormônios que jorra dos instrumentos. As letras também são violentíssimas, negras, radicais mesmo (sem escorregar para o niilismo burro que impera no underground americano). Falam de amor, sexo, preconceito, inteligência; do estado das coisas e do sentido da vida. Confira "Smells Like Teen Spirit", sobre a apatia teen, que está traduzida nesta edição... mas a melhor mesmo é "Breed". É, segundo Cobain, sobre "Ser de classe média, casar jovem, ter filhos, assistir TV toda noite - e detestar tudo isso".

A década de 90 já tem seus Dead Kennedys - e desta vez, eles estão no topo das paradas.



-André Forastieri, março de 1992-

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Assim como os Beatles influenciaram praticamente tudo o que veio no rock/pop depois deles, o Nirvana deixou sua marca em todo o rock da década de 90, e, com isso, fizeram as grandes gravadoras prestarem atenção no tal “rock alternativo”. Bandas que surgiram na mesma época, como o Smashing Pumpkins, o Pearl Jam e o Soundgarden, que vieram depois, como o Weezer, o Radiohead, o Silverchair, e até mesmo que vieram antes e já batalhavam no underground, como o Pixies e Sonic Youth, não se tornariam conhecidas se não fosse a explosão de “Nevermind” junto ao grande público.


- Jornal A Razão, 28 de Setembro de 2006 -


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Bueno, para quem ainda não tenha escutado o álbum, aqui um link para baixá-lo.

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