9.29.2006

Reportagem (11): A última grande revolução no rock

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Há 15 anos atrás, em setembro de 1991, o Nirvana lançava o seu segundo álbum, “Nevermind”. Ninguém imaginava a revolução que ele causaria.


Uma revolução, pelo menos na música e talvez também na cultura pop, nunca é realmente percebida quando está acontecendo. No caso específico da música, quando um álbum é “inovador”, “original” para a época, uns poucos gatos pingados escutam, e a maioria desses ainda não percebem o potencial explosivo do que estão escutando. É preciso tempo – dias, semanas, meses, por vezes até anos – para assimilar o impacto, porque se ele é realmente inovador, não vai haver nada, pelo menos naquela época, que sirva de base de comparação para uma definição qualquer. No máximo pode haver, entre uns poucos mais rodados de bagagem musical, uma sensação de que “algo está acontecendo”.

Há quase exatos 15 anos atrás, em 24 de setembro de 91, esse “algo está acontecendo” foi sentido pela ultima vez na história da música pop. “Nevermind”, o segundo álbum do Nirvana, chegava às lojas de todo o planeta embalado pelo explosivo clipe de “Smells like teen spirit”, o primeiro single do disco. Em pouco tempo, a gurizada roqueira – que na época era maioria em praticamente todo o planeta – começou a trocar os excessos do hard rock farofa de bandas como Poison, Motley Crue, Guns’n’Roses, pela simplicidade e sinceridade da música feita por apenas três caras, liderados por um jovem loiro do interior dos Estados Unidos, que se vestia de xadrez porque os trabalhadores da sua região assim se vestiam, e – suprema inocência! – tocava poucos e barulhentos acordes porque era assim que sabia fazer. Alguns meses depois de lançado, mais precisamente em janeiro de 92, “Nevermind” já destronava o então rei do pop Michael Jackson do primeiro lugar da Billboard, a mais famosa das listas dos álbuns mais vendidos do planeta, e Kurt Cobain, o tal jovem loiro, era o rock star mais amado do mundo.

Hoje em dia, quem escuta o álbum pode até se perguntar “mas o que tem de inovador nisso?”. Na época, misturar guitarras barulhentas – nem tão rápidas quanto às do punk rock, nem tão pesadas quanto às do heavy metal – com melodias pop era algo bastante inovador e original. Mas, talvez, o que tenha marcado mesmo o Nirvana tenha sido a atitude da banda: quem estava ali eram três pessoas normais, que falavam e faziam as mesmas coisas que todo mundo, que não eram fabricados por empresários e produtores nem forçavam a barra como os posers do hard rock. Era o retrato fiel de toda uma juventude que acompanhava de perto o tal mundo pop, mas nunca se via lá.

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A capa clássica




A capa do Nevermind é uma das mais conhecidas da história do rock. A idéia inicial bolada por Kurt Cobain era a de estampar no disco a foto de um bebê nascendo na água. Como era muito caro comprar uma foto desse jeito, decidiram contratar um fotógrafo, Kirk Weddle, que para realizar pelo menos uma parte da idéia de Kurt pediu para retratar o filho pequeno de um casal de amigos. Então, mesmo sem ganhar nada, Spencer Welden, na época com 4 meses, foi fotografado nadando em direção a uma nota de um dólar; sem querer, o bebê acabou se tornando um símbolo de toda uma geração. Tempos depois, o Nirvana ainda retribuiu seu “modelo infantil” com uma cópia em platina de “Nevermind”. A revista Rolling Stone, no aniverário de 10 anos do álbum, pegou o mesmo Spencer e repetiu a foto, desta vez com o guri nadando em direção a uma nota de dez dólares. Uma sátira da capa famosa também foi feita pela Rolling Stone, dessa vez usando Bart Simpson como o bebê (foto).


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As primeiras críticas de Nevermind:

Duas das primeiras críticas publicadas na grande mídia: a primeira é de novembro de 1991, da edição 618 da Revista Rolling Stone, escrita pelo jornalista Ira Robbins; a segunda é a primeira publicada no Brasil, escrita por André Forastieri para a revista Bizz n º 80, de março de 1992. Veja alguns trechos da crítica do americano (1) e a íntegra da do brasileiro (2):


1)
“Liderados pelo vocalista e guitarrista Kurt Cobain, o Nirvana é a última das bandas surgidas no underground que vem testar o grande público para o rock alternativo. Devido a rigidez da porção das pessoas que desfrutam do rock de guitarras que não é o heavy metal, a versão da verdade do trio do estado de Washington é, provavelmente, tão crível quanto qualquer outra. Uma dinâmica mescla de power chords, energia frenética e sobriedade sonora, o Nirvana ergue sólidas estruturas melódicas - rock que gruda no ouvido, cujos expoentes principais são o Replacements, Pixies e Sonic Youth - e logo as trata de demolir com gritos desaforados e caóticas explosões guitarrísticas. Quando Cobain decide ser punk - e sua voz é um instrumento muito versátil para isso - deixando de acariciar a melodia para raspar com a força de gritos por vezes deslocados, o baixista Krist Novoselic e o baterista Dave Grohl entram para manter a canção equilibrada, evitando que ela não se desintegre de modo caótico. Mesmo que o Nirvana não esteja fazendo nada de verdadeiramente novo, “Nevermind” tem as canções, o caráter e o espírito para ser muito mais do que uma mera reformulação dos hits oitentistas do rock universitário americano. (...)

Contendo alguns ocasionais (e provavelmente intencionais) erros de gravação, a maioria das canções (como “On a plain, “Come as you are” e Territorial Pissings”) mostram a habilidade da banda em introduzir a sutileza em um contexto denso e barulhento. Num outro extremo do disco, “Something in the way” flutua numa nuvem translúcida de guitarras acúsitcas e violoncelo, enquanto “Breed” e “Stay Away” são puro barulho; esta última, ainda, termina com uma impactante explosão sonora. (..)
Frequentemente, as bandas do underground gastam seus esforços em discos que não estão preparadas para fazer, e logo dilapidam suas forças e inspiração em árduas turnês. “Nevermind” põe o Nirvana numa encruzilhada: são operários gladiadores do rock garageiro que põem seus olhos em uma terra de gigantes. “


-Ira Robbins, novembro de 1991-



2)
"Esses caras vão nos enriquecer." Bruce Pavitt, dono da gravadora Sub Pop, sobre o Nirvana. Na BIZZ 6O, junho de 90.

Ou seja: o fato do Nirvana ter vendido mais de 2,5 milhões de cópias só nos EUA e desbancado Michael Jackson do alto da Billboard não deve surpreender você, velho leitor de BIZZ. Como diz aquele slogan da nossa colega corporativa/concorrente eletrônica, você viu antes aqui.

Mas as vendas que se danem. A questão fundamental é, como sempre: vale a pena desembolsar aquela suada bufunfa para comprar Nevermind?

Se você gosta de Pixies ou Damned ou Stooges ou Kinks/Who ou Gang Of Four fase Entertainment! ou Mudhoney ou rock de garagem sessentista ou qualquer tipo de hard rock áspero, puto e sem polimento, vale. Principalmente, se você gosta de punk californiano politizado, vale a pena. Vale vale vale. Compre três, dê um para o seu amor e outro para o seu melhor amigo.

OK, segunda questão - e aí é papo de jornalista, de gente que está tentando entender o que se passa no universo adjacente e não se limita a curtir as coisas (não que só curtir seja limitante, mas compreender é o nosso emprego e a nossa obsessão - ou pelo menos deveria ser). Pergunta 2: que significa a velocidade warp com que o Nirvana saiu dos cafundós do estado de Washington para os corações, as mentes e os toca-discos do público americano, quiçá mundial?

Significa que punk's not dead, oba! Quinze anos depois, os espertos da nova geração assumiram o punk como sua melhor representação musical. É, o Nirvana é punk, sim, punk paca - ainda que seu vocalista-letrista-guitarrista Kurt Cobain, 24, seja muito novo para ter curtido punk na época.

E punk não só na avalanche animalesca de distorção e hormônios que jorra dos instrumentos. As letras também são violentíssimas, negras, radicais mesmo (sem escorregar para o niilismo burro que impera no underground americano). Falam de amor, sexo, preconceito, inteligência; do estado das coisas e do sentido da vida. Confira "Smells Like Teen Spirit", sobre a apatia teen, que está traduzida nesta edição... mas a melhor mesmo é "Breed". É, segundo Cobain, sobre "Ser de classe média, casar jovem, ter filhos, assistir TV toda noite - e detestar tudo isso".

A década de 90 já tem seus Dead Kennedys - e desta vez, eles estão no topo das paradas.



-André Forastieri, março de 1992-

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Assim como os Beatles influenciaram praticamente tudo o que veio no rock/pop depois deles, o Nirvana deixou sua marca em todo o rock da década de 90, e, com isso, fizeram as grandes gravadoras prestarem atenção no tal “rock alternativo”. Bandas que surgiram na mesma época, como o Smashing Pumpkins, o Pearl Jam e o Soundgarden, que vieram depois, como o Weezer, o Radiohead, o Silverchair, e até mesmo que vieram antes e já batalhavam no underground, como o Pixies e Sonic Youth, não se tornariam conhecidas se não fosse a explosão de “Nevermind” junto ao grande público.


- Jornal A Razão, 28 de Setembro de 2006 -


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Bueno, para quem ainda não tenha escutado o álbum, aqui um link para baixá-lo.

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9.22.2006

Review (2) : É rock para dançar mesmo

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Um breve relato do que foi o show do Autoramas em Santa Maria no último sábado, 16 de setembro, no Macondo Bar.


Rrrrrrrrrrrrrrrrock!, Rrrrrrrrrrrrrrock!, grita seguidas vezes o vocalista, guitarrista e líder do Autoramas, Gabriel Thomaz. É como um líder de exército chamando seus comandados para uma batalha, Rrrrrrrrrrrrrrrrock!, com ênfase no r, berro que ganha como resposta muitos gritos e mãos para cima em sinal de aprovação - até de obediência - ao que o líder pedir para ser feito. É uma amostra clara de que o público está ganho desde o momento em que os três integrantes do Autoramas (Gabriel e mais Bacalhau na bateria e Selma no baixo e vocal) tocam os primeiros acordes. Aliás, antes de começarem a tocar e sim desde que a banda sobe ao palco, que antes já havia recebido o hardcore porrada dos santa-marienses da TSF e o rock’roll lembrando os Strokes (inclusive no visual e na juventude dos integrantes) dos Stratopumas, de Porto Alegre. Mas é o Autoramas é o motivo da presença das pessoas ali, não há como negar.


Banda das mais importantes do cenário independente do Brasil, com nove anos de uma estrada que já se alongou até ao Japão e a Europa, eles sabem como agradar um público que nunca os viu. Tocam algumas músicas inéditas, do ainda não lançado e não nomeado quarto álbum de estúdio, mas não se esquecem dos hits, como Fale Mal de Mim, Você Sabe, Carinha triste, Autodestruição, entre outros. Também não se esquecem de serem simpáticos: Gabriel e Selma puxam uma dancinha robótica em algumas faixas que só não é repetida pelas pessoas porque o “espaço para manobra” de cada uma é realmente muito pequeno. Além disso, o vocalista tenta conversar bastante com o público, que responde normalmente com brados de incentivo e, principalmente quando ele profere o já citado grito de guerra, com as mãos para cima fazendo o famoso gesto do chifrinho. Sobra até dedicatória de uma música para uma aniversariante em transe grudada no palco, e uma “canja” de outra parte do pessoal que toma o microfone da baixista Selma e canta (ou berra) junto com Gabriel.


O vocalista, guitarrista e animador da noite Gabriel Thomaz


A banda não se auto-intitula fazedora de um “rock para dançar” por acaso: basta começar o show para se notar que, realmente, é bastante difícil ficar parado. Num dado momento, Gabriel puxa Blue suede shoes, do rei Elvis Presley, e o passo “rock’roll de baile” é inevitável; em outro, no meio de uma música da banda surge um cover do Ramones - hora do segundo grito de guerra, o “ Hey hey let’s go” - e a impressão que se tem é que ninguém presente no Macondo está parado. Tudo se mexe, e não é o álcool o responsável, mas sim um trio de baixo, guitarra e bateria tocando alguma coisa entre surf music, punk rock, new wave, jovem guarda e rockabilly. Ou simplesmente rrrrrrrrrrrrrrock.



- Jornal A Razão, 21 de setembro-

Fotos: Wandeclayt


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9.20.2006

Notas (3)

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Sálvia no YouTube



O intitulado “Reggae 'n Roll” da banda santa-mariense Sálvia pode ser visto também no Youtube. No último show da banda em Júlio de Castilhos, dia 12 de agosto no clube Félix da Cunha, foram gravadas imagens da banda tocando a música “Pensando”, que tem letra do “poeta” da banda, o ex-baixista Pedro Gaiger, e arranjos dos atuais integrantes.

Veja o vídeo aqui

Não é bem um clipe, mas serve como um registro importante de um dos grupos que mais tocam em Santa Maria e que também está em fase de desenvolvimento do primeiro álbum.

Quem ainda não conhece o reggae com misturas de rock e funk que a Sálvia faz pode acessar ainda o espaço deles no Trama Virtual , ou então procurar por eles no Orkut. Hoje, a banda é formada por Raoni Manrique no baixo, Vinicius Schenini e Théo Buriol na guitarra e voz e Caetano Biavaschi na bateria e voz.


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9.15.2006

Reportagem (10): Cinismo rock’roll numa das grandes bandas independentes do país

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Com três discos de carreira e preparando o quarto, o Autoramas toca pela primeira vez em Santa Maria neste sábado




Para os mais saudosos, a palavra Autoramas remete imediatamente a um dos brinquedos que mais alegrou a infância de quem viveu nos anos 80 e início dos anos 90. Para os mais ligados em música, a palavra é lembrada junto dos versos “Fale mal de mim, fale o que quiser de mim, mas por favor não deixe que em nenhum momento, eu deixe de estar no seu pensamento” de uma das músicas que mais tocaram no ano de 2000, o hino cínico do rock’roll nacional “Fale mal de mim”. Seis anos, dois álbuns, e inúmeros versos igualmente memoráveis depois, a banda Autoramas se apresenta pela primeira vez em Santa Maria neste sábado, no Macondo Bar, junto da promessa gaúcha Stratopumas. A abertura do show ainda fica a cargo dos santa-marienses da TSF.


A trajetória do Autoramas começou ainda em 97, quando Gabriel Thomaz (vocal e guitarra), se muda de Brasília para o Rio de Janeiro, e junta os amigos Simone (baixo e vocal) e Bacalhau (ex Planet-Hemp, bateria) para tocar um “rock para dançar”, com influência da surf music, jovem-guarda, new-wave e punk-rock. Gravam o primeiro disco em 2000, Stress,Depressão & Síndrome do Pânico, lançado por uma grande gravadora, a Universal. É deste disco o primeiro hit da banda nas paradas brasileiras, “Fale mal de mim”. No ano seguinte, lançam Vida Real, o segundo disco, que tem as também conhecidas “Autodestruição” e “Carinha triste”, e saem em turnê pelo Brasil inteiro e também pelo Japão, onde deixam uma versão local do disco. Em 2003, lançam o terceiro álbum, Nada Pode Parar os Autoramas, dessa vez por um selo independente. A aparição na mídia diminui, as rádios passaram a tocar menos as músicas da banda, mas o Autoramas seguiu firme no circuito independente, sendo atualmente um dos que mais fazem shows pelo país.



Da esquerda para a direita, Bacalhau, Gabriel e Selma.



No ano passado, já com a entrada da baixista Selma, a banda voltou a ganhar bastante destaque na imprensa pela gravação do memorável clipe de “Você Sabe”, que se tornou o mais premiado do VMB, a premiação mais importante de videoclipes do país, organizada pela MTV. Neste ano, enquanto preparavam um novo álbum, resolveram sair em uma tour pelo sul do país, passando por três cidades gaúchas – Santa Maria incluída, o que mostra que o pessoal do Macondo anda antenado em trazer boas atrações nacionais e regionais para a cidade.


O show de sábado promete um pouco de cada álbum, não deixando de fora os “clássicos” da banda, e trazendo também algumas novidades como “Mundo Moderno”, que Gabriel diz ser “uma das melhores músicas do Autoramas em todos os tempos”. O vocalista diz ainda que eles tocam de cinco a seis músicas do novo álbum, que está em fase final de gravação e ainda não tem nome.


-- Jornal A Razão, 14 de Setembro de 2006 --


Aí vão três músicas que eu considero como das melhores do Autoramas: "Copersucar" (clique aqui para baixar), ", Eu era pop" e "Sonhador", as três do segundo cd da Banda, Vida Real, de 2001. Aliás, elas estão nesta mesma sequência no álbum.



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9.11.2006

The Blues

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Robert Johnson (1911-1938) não foi o inventor do blues, mas certamente um dos mais influentes "bluesman" da história.


Nos longíquos anos 30, o blues era ainda um ritmo nascente, que aos poucos ganhava repercussão fora dos guetos negros do sul dos Estados Unidos. Johnson, boêmio costumaz, enquanto andava por essa região colecionando amantes e polêmicas, desenvolvia um jeito diferente de tocar o blues, empregando mais técnica nos riffs e usando bastante as cordas graves do violão para criar um ritmo regular e coeso.

Em meados da década de 30, ele resolve entrar em estúdio no Texas, e em apenas duas gravações, registra 29 músicas que acabariam se tornando a única obra que o cantor e guitarrista deixaria para a posteridade. Como morreu cedo, em 1938, Johnson não pode ver o "estrago" que suas músicas causariam no blues: nos anos seguintes, praticamente toda a sonoridade com que o ritmo ganharia o mundo acabou tendo a influência de Johnson. Tanto que suas músicas, escutadas hoje, tem aquele "DNA" blueseiro que mesmo quem não conheça muito o ritmo consegue deduzir que aquilo ali é o blues.

Aí vão duas músicas do Robert Johnson:

- Sweet Home Chicago (Baixe aqui )

- The Crossroads (Baixe aqui)


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9.05.2006

O Cordel

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Dando uma pausa nas bandas gaúchas...



O Cordel do Fogo Encantado é do interior de Pernambuco (Arcoverde, há 250km de Recife) e já há algum tempo vêm se destacando no cenário nacional. Inclusive prepara novo CD, o terceiro, para em breve ser lançado. Aqui você pode conhecer a capa e baixar úma música do novo álbum.

Mas, para quem não conhece, um exercício de "imaginar a banda" : tente misturar uma batucada (com a mão) com violões, literatura de cordel com teatro, imagens psicodélicas com as do sertão nordestino, um vocalista/poeta com um coro de sertanejos e pense no que nisso tudo poderia resultar.
Pois bem.
Se alguma imagem for formada, ela ainda será apenas próxima do que é a banda. O melhor é escutar mesmo.

Então, aí vão duas faixas do primeiro álbum, Cordel do Fogo Encantado, de 2001, produzido por Naná Vasconcellos. A primeira é "Chover(ou Invocação para um Dia Líquido" (baixe aqui ), talvez o maior hit do Cordel.





A segunda não é uma música, mas uma poesia que o vocalista Lirinha (na foto acima, em momento "Ligh my fire") costumava recitar nos shows da banda e acabou entrando no primeiro disco também, "Ai se Sêsse" (baixe aqui). O autor dos versos é o poeta Zé da Luz, um nordestino do início do século passado. A letra, abaixo:

Se um dia nois se gostasse
Se um dia nois se queresse
Se nois dois se empareasse
Se juntim nois dois vivesse
Se juntim nois dois morasse
Se juntim nois dois drumisse
Se juntim nois dois morresse
Se pro céu nois assubisse
Mas porém se acontecesse de São Pedro não abrisse
a porta do céu e fosse te dizer qualquer tolice
E se eu me arriminasse
E tu cum eu insistisse pra que eu me arresolvesse
E a minha faca puxasse
E o bucho do céu furasse
Da vês que nois dois ficasse
Da vês que nois dois caisse
E o céu furado arriasse e as virgi toda fugisse



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9.02.2006

Reportagem (9): "Funk como le Gusta"

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Banda Consuelo mistura funk de raiz com rock, pop, punk, surf music, música latina....



Um desavisado passa por um local que lembra uma garagem sem porta e escuta um barulho, que não é de som mecânico e sim ao vivo. Após alguns segundos, reconhece como sendo uma música do guitarrista mexicano Carlos Santana. Ele pára, resolve escutar mais, e reconhece outro som, desta vez um rock mais pesado, do Queens of The Stone Age. O desavisado agora gostou, e decide ficar mais tempo ali, com o ouvido na parede que dá para a dita garagem. Logo vem “Search and Destroy”, do padrinho do punk rock Iggy Pop e os seus Stooges – não com a mesma intensidade, mas com uma levada diferente. Alguns minutos depois, é a vez de Chico Science e Nação Zumbi; a próxima, Tim Maia da fase Racional, faz com que o desavisado - a esta altura agradecendo silenciosamente por passar ali como ‘desavisado’ - comece a tentar acompanhar o ritmo batendo com as mãos na parede. Acende um cigarro, olha para a rua semi-deserta à noite, e deixa o ouvido guiar o movimento desajeitado do corpo. Seguem-se mais três músicas, da fase áurea do Red Hot Chili Peppers, e a essa altura, o desavisado já resolveu entrar no local, movido pela curiosidade de saber qual/quais bandas está/estão tocando.

São músicas tão diferentes entre si que nem parece apenas uma banda. Mas é, e ela tem o nome de Consuelo. A “ecleticidade” do repertório é explicado de uma forma simples:

_ Tocamos o que a gente gosta”, diz o vocalista/guitarrista da Consuelo, Marlon Henrique, 22 anos. “Gosto bastante de funk (o surgido nos EUA, não confundir com o carioca), mas blues, rock, pop, são influências que, de alguma forma, aparecem na nossa música”,

A banda, complementada por Marlon Bertoncello, 21 anos, na bateria, Renan Perlin, 21, na outra guitarra e Marcelo Dornelles, 23, no baixo, fez a sua primeira apresentação para o grande público na sexta feira passada, no Seattle Studio Bar. O show, com esse repertório dos mais ecléticos, durou cerca de uma hora e foi uma amostra do que uma música suingada, naturalmente dançante, pode fazer com quem escuta:

_ Quando tocamos as músicas do Red Hot Chili Peppers, não tão conhecidas e mais dançantes que os “hits”, o pessoal começava a se balançar no ritmo da música, mesmo que eles nem conhecessem o que estava sendo tocado”, diz Marlon, que junto com o seu xará baterista, são os “cabeças” da banda.




Da esquerda para a direita, Renan, Marlon na bateria, o outro Marlon no vocal, e um pedaço do Marcelo



Essa mistura toda no som, segundo eles, não é proposital, vindo naturalmente da junção do que gostam de tocar com uma pegada mais dançante do funk, onde o que importa é mais o ritmo do que a melodia em si. “Não nos importamos em parecer uma coisa, ou tocar só para agradar a todos, acreditamos que deva ter gente que gosta do mesmo que a gente gosta e que vai curtir o som” comenta o vocalista. Ele critica as bandas santa-marienses e os músicos que, normalmente, são muito fechados em um estilo só. A procura por um baixista serve de exemplo dessa dificuldade: eles falaram com uns quantos que, inicialmente topavam, mas era só mostrar o repertório, de funk, rock, música latina e outras misturanças, para que se sentissem acuados e desistissem, sem dar maiores explicações.


De tanto procurar, acabaram achando um baixista na cidade de origem dos dois, Jaguari. Completando a formação, juntou-se mais um guitarrista, também de Jaguari, e, até o show no Seattle, foram apenas 3 ensaios com a banda completa.







O nome da banda foi escolhido através de uma “confusão” ao escutar uma música do Santana. Em determinada passagem, eles entenderam que o mexicano dizia, em espanhol, “Consuelo”, quando na verdade a frase certa era “los cueros se llamam”. Mesmo depois de entenderem a letra, resolveram nomear a banda com o Consuelo mesmo.
Para o futuro, a banda só tem um projeto definido: tocar bastante.

_ Para compor músicas próprias é cedo, temos de ter mais entrosamento como banda, o que só vai acontecer se tocarmos bastante, diz o vocalista.


Fotos: Arquivos da banda


- Jornal A Razão, 27 de Abril de 2006 (com modificações) -


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