3.31.2008

Publicidade atrasada

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Alguns meses atrás, fiz um post sobre uma das figuras mais raras que já conheci no meio musical: o Tony da Gatorra.

Tempos depois, resolvi me aprofundar mais no assunto. Usei o post como uma espécie de preview e busquei vender a pauta - sobre o Tony, obviamente - para alguma revista. Preferi a Brasileiros, uma revista nova de reportagens que tem como slogan o singelo "todas as histórias que valem a pena ser contadas".

Pois bem, eles acabaram aceitando a proposta, e a matéria saiu na edição de fevereiro da revista, a que tem a capa de duas mulheres na Antártida. Como não dá para ler esta matéria no site da revista, vou colocar o texto na íntegra aqui abaixo. As fotos são de Neco Varella.
Quem tiver a revista, pode procurar na seção "30 dias", que abre a edição.

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Ele consertava aparelhos eletrônicos até inventar um instrumento singular, a gatorra, e ganhar o mundo com sua invenção.

_ Tu sabias que vendi uma gatorra pro Nick, o guitarrista do Franz Ferdinand?

A pergunta surge na sala de uma casa simples de Esteio, na Grande Porto Alegre. E vem com um entusiasmo que não deixa tempo para resposta, pois logo Tony da Gatorra já está falando do ônibus com que excursionou por três cidades na Inglaterra e na Escócia, em julho de 2007. “Era um ônibus com 10 camas, mesa para jogar carta, geladeira cheia de cerveja.”. Quem lhe fazia companhia eram Guilherme Barella e Bruno Ramos, que tocavam junto com Tony, e mais três bandas britânicas, naquilo que a empresa que patrocinava a tour chamou de “Uma jam cultural entre o talento do Brasil e do Reino Unido”. “Foi a primeira vez que fui para o exterior, não tinha nem passaporte”.

Antônio Carlos Correia de Moura – vulgo Tony da Gatorra – tem 56 anos. Acaba de lançar o seu segundo disco, Novos Pensamentos, com participação de nomes conhecidos no meio musical nacional como o de Carlos Eduardo Miranda, Kassin e Luísa Lovefoxx, do Cansei de Ser Sexy O álbum é distribuído pela Slag Records, uma gravadora inglesa. Em março, Tony vai tocar no Japão. “Faz dois anos que vivo só das gatorras e dos shows”. “Mas estou com dois amplificadores valvulados ali na oficina, esses eu gosto de arrumar. Quer dar uma olhada?”

Tony passou cerca de 30 anos vivendo de consertos de aparelhos eletrônicos. Aprendeu o ofício em meados da década de 1970, através de um curso por correspondência do Instituto Universal Brasileiro. Guarda até hoje o diploma, emoldurado, em cima da mesa de trabalho de sua oficina, ao lado dos amplificadores valvulados que faz questão de mostrar. “Jimi Hendrix, Rolling Stones, todo o pessoal desta época gravou com esses aqui”, aponta, mostrando as válvulas. “Já tinha visto um desses?”.




Ele conta que o estalo de produzir a gatorra aconteceu por volta de 1994, mas ela só ficou pronta quatro anos depois. O nome veio de um trocadilho com a palavra “guitarra”, de onde seu instrumento empresta o design. Mas somente o design, pois o som é, como define seu criador, “uma percussão sintetizada”. “Com a mão direita toco os sons de bateria - bumbo, prato, caixa, etc - e, com a esquerda, outros sons percussivos aleatórios”.

As primeiras músicas com a gatorra saíram com dificuldade. “Não sabia nada de música, foi difícil no início”. Depois de compor algumas, no final da década de 1990, Tony chamou atenção de uma rádio de Porto Alegre, que pôs suas faixas para tocar. Passou a ser convidado seguidamente para se apresentar em um game-show jovem de um canal de televisão gaúcho. Dali foi para São Paulo, onde fez shows e conheceu figuras da cena musical nacional. Estes contatos, anos depois, renderiam um convite da gravadora Peligro para gravar seu primeiro trabalho, Só Protesto, que saiu em 2005.

O disco causou tanto estranheza - por sua inclassificável música – quanto simpatia, principalmente pela forte e sincera crítica de letras como “Eu Protesto”, “Voz do Sem Terra” e “Assassino”. Talvez pelos dois motivos, em meados do ano passado Tony foi convidado para fazer sua primeira tour internacional, no Reino Unido. Lá conheceu Nick McCarthy, do Franz Ferdinand, que veio a comprar uma gatorra, a nº7 das dez até hoje produzidas - e vendidas – por Tony. “A dele é verde-amarela, vem com ritmos pré-programados, é toda de alumínio, mais leve”, conta Tony, orgulhoso de sua criação.

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O pessoal da revista foi muito gentil em não mudar uma vírgula do texto que mandei para eles - quem é do ramo sabe o quanto editores gostam de modificar textos de seus comandados.

O Tony também foi bem atencioso comigo, me recebeu muito bem, com direito até a latinha de cerveja gelada. E ainda por cima me deu carona na volta até a estação do Trensurb de Esteio, onde ele mora.

Enfim, foi bem interessante fazer a matéria.

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