11.07.2007

De Esteio para o mundo

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Tony e sua Gatorra em ação

A
ntes de qualquer conclusão precipitada pela imagem exótica da foto acima, façamos a apresentação. Ou melhor, deixemos a própria figura se apresentar:

Tony da Gatorra é um artista. Mora em Esteio, Rio Grande do Sul, onde sobrevive do conserto de aparelhos eletrônicos. No final da década de 90, Tony criou um instrumento, a gatorra, uma mistura de bateria eletrônica e sintetizador. Construiu a gatorra para protestar contra a violência, a corrupção, a ganância, a fome e outros males do Brasil.

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Tony é um artista sui generis. De figuraça indie da cena musical gaúcha à tour pela Inglaterra e Japão, com direito à show de abertura para a banda Franz Ferdinand, não passaram mais do que 8 ou 9 anos. É bastante tempo se considerado o contexto atual ultraveloz de surgimento-esquecimento de uma banda; mas não quando se fala de um homem que passou 25 dos seus 56 anos consertando televisores e outros aparelhos eletrônicos em uma loja numa cidade da Grande Porto Alegre.


Como naqueles estalos que bem poderiam ser divinos, Antonio Carlos Correia de Moura - a alcunha na identidade de Tony - teve a idéia de usar seus conhecimentos de técnico em eletrônica, adquiridos boa parte em revistas da área, para fazer algo além do se espera de um mero consertador de aparelhos eletrônicos: construir seu próprio instrumento musical. Era meados de 1994. Tony, com um visual que já incluía o cabelo comprido e o bigude proeminente, a lá um Frank Zappa guarani dos pampas, juntou sintetizadores, modificadores de timbre, capacitores, circuitos diversos e, quatro anos depois, com o auxílio do dinheiro arrecadado pela venda de sua moto, pariu a sua já famosa Gatorra I, um instrumento musical que, segundo o próprio, “poderia levar algo diferente para as pessoas”.


A Gatorra em detalhes


Pronto o instrumento, Tony decidiu que havia chegado a hora dele usar sua soltar toda sua angústia contra a situação política e social brasileira, acumulada em cinco décadas de vivência bastante humilde. Criou letras fortes , sinceras acima de tudo, que versavam contra todo tipo de corrupto, assassino e demais figuras comuns na política brasileira. Pródiga em criar loops de bateria eletrônica misturado à sombrios sons de sintetizadores, a gatorra pareceu o instrumento certo para Tony ir à luta para mostrar a sua mensagem. À luta entenda-se primeiramente por pleitear espaço em programas de TV da capital gaúcha. Conseguiu em alguns; o mais notório foi o College na TV, da Band-RS, de onde virou habitueé.

Em 2005, sai o primeiro disco de Tony, “Só Protesto” (resenha dele aqui), lançado inicialmente de maneira informal, gravado em CD-R, para depois ganhar distribuição de uma gravadora, a Slag Records (selo que colocou Arcade Fire, Four Tet e o novo do Teenage Fanclub nas lojas brasileiras).
O fascínio que Tony causava nas pessoas que o viam tocando misturava-se à uma certa incredulidade: mas, afinal, que diabos esse cara quer com esse som extremamente tosco, cantando essas letras tão simples que beiram ao ridículo,e, pior, fazendo um discurso contra tudo e todos ao começo de cada música? É pra rir ou levar a sério?

Bem, tire suas próprias conclusões com o vídeo abaixo. Pode-se dizer tudo dele, menos que não seja sincero naquilo que faz.
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Tony tocando em sua cidade natal, em plena praça central


Apesar de alguns shows em São Paulo, Tony vivia com o dinheiro de seus consertos eletrônicos. Produziu mais gatorras, e uma delas, a nº 7, foi parar nas mãos de Nick McCarthy, guitarrista da banda escocesa Franz Ferdinand, quando estes estiveram pela segunda vez no Brasil, em setembro do ano passado.

Ajudado por este fato, em pouco mais de meio ano a carreira de Tony deu uma decolada diretamente para a Europa. Convidado por uma produtora internacional para fazer um tour pela inglaterra, em julho deste ano, Tony teve seu momento de glória internacional, como mostra o trecho abaixo, uma parte de um relato tirado de seu blog, o tonydagatorra.blogspot.com

Detalhe: ele escreve cartas ou emails com essa grafia das palavras mesmo.

ai pesoal da paz tranguilo?
vou relatar os acontecimentos dos shows na europa ...... dia 25 chegamos na inglaterra na cidade de manchester em seguida partimos de buzum até liverpool onde aconteceu noso primeiro show e eu ganhei uma camiseta do trocabrahma muitos faz e admiradores me cunprementaram e eu nunca fui tao beijado por tantas mulheres londrinas belas e lindas eu me senti um rrei feliz...no término deste show partimos para lasgom numa viagem de 11 horas em lasgom foi demais o show foi perfeito muita alegria e emoçao eu subi no palco 3 vezes e todos chamavam meu nome no camarim muitas frutas chocolates e muita mas muita cerveja da brahma e muitos autografos e novamente ganhei muitos beijos .... as escosesas gostam de beijar ...isto é muito bom .... (...)

Cartaz da tour

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Pois bem, esse é Tony da Gatorra. Ao que consta, seu segundo disco será lançado ainda este ano pela Slag Records e terá participação do grupo Wolf Eyes (EUA), Kassin (Artificial, Kassin+ 2, Orquestra Imperial, produtor dos últimos cds do Los Hermanos), Lovefoxxx (Cansei de Ser Sexy), Carlos Eduardo Miranda (produtor, jurado do Ídolos), do rapper Parteum e produção de Miranda, Bruno Ramos (também seu advogado) e Gui Barrella (BlueAfternoon).

Quem quiser escutar ou conhecer mais de Tony, pode acessar o seu My Space ou a sua página no Trama Virtual, além do já citado blog.

Aqui dá para dar uma brincada com o som da gatorra.

Como bem diz Tony quando se despede, Paz!

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3 comentários:

Augusto Paim disse...

Trata-se de uma figura interessantíssima, definida por um símbolo/objeto também interessantíssimo (a gatorra). O texto é bastante coeso e repassa muitos links, desdobrando o post, ampliando a pauta. É realmente uma bela apuração e um belo texto.

Fico pensando no que um encontro entre tu e o Tony não pode provocar... Com certeza, um perfil memorável, se o Tony puder ser bem visualisado na matéria!

Grande abraço, tchê!

Augusto Paim disse...

Eu olho o teu blog e o do Gustavo e novamente penso: o que juntos nós não poderíamos fazer. Um blog de gabarito sobre quadrinhos, outro sobre música, outro sobre política. Se o Iuri deslanchasse o dele, sobre tecnologias... Se não fosse a falta de tempo...

Leonardo disse...

Poisé né tche, mas não só a falta de tempo que nos impede de fazer isso.

Talvez seja a falta de iniciativa nossa em querer apostar numa coisa que, por hora, é incerta.

Eu ainda acredito que vale a pena. Também, como aprendiz de pesquisador do assunto, não teria como ter opinião diferente da entusiasta.