8.30.2008

Gauchismo

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Nunca fui daqueles gaúchos de "cultivar as tradições" do Estado. Um pouco porque, diferente de boa parte dos nascidos aqui no RS, não tive qualquer contato com o campo quando criança, ainda mais com o campo mítico cantado nas músicas tradicionalistas e cultuado nos CTG's. Soaria falso, portanto, se cultivasse e propagasse uma cultura que para mim, pelo menos na primeira fase da adolescência, me dissesse tanto sobre mim quanto o grunge de Seattle ou o manguebit de Recife.

Só que no Rio Grande do Sul é difícil fugir das "tradições gaúchas". Por bem ou por mal, elas estão sempre ali; é a cobertura exagerada da mídia na Semana Farroupilha, os desfiles de 20 de setembro percorrendo todos os confins do estado, a escola buscando alunos para formar os grupinhos de dança gaúcha, o churrasco aos domingos e todos os seus movimentos transformados e vendidos como clichês das tradições gaúchas, o chimarrão tomado até nos mais quentes janeiros de verão. Tudo isso, e mais a influência ativa das muitas pessoas que tinham o gauchismo como modo de vida autêntico e das outras tantas que tinha esse mesmo modo como uma boa nostalgia dos "tempos antigos", torna qualquer nascido no RS no mínimo conhecedor por tabela destas ditas tradições.

Pois bem. Essa introdução toda serve aqui neste post como uma tentativa de buscar explicações para entender o porquê desse vídeo abaixo ter me deixado tão arrepiado:


Todo esse gauchismo muitas vezes tão forçado, que idolatra uma figura criada a partir de míticos exageros de uma realidade crua do interior, no vídeo acima se apresenta com uma sinceridade difícil de contestar.

Leopoldo Rassier não interpreta, mas vive a bela letra do recém falecido Antonio Augusto Ferreira, poeta daqui de Santa Maria. O Veterano que dá nome à música é ele, e ninguém constesta. Os Serranos, no auge de sua forma técnica em 1982, enriquecem a já bonita melodia criada por Ewerton Ferreira; a introdução da música, só com os dois violões, é das coisas mais lindas já ouvidas na música gauchesca, daqueles que se põe pra repetir duas, três vezes e ela continua arrepiando o pelo dos mais emocionados.

A gaita, a percussão, os vocais de fundo, o cenário mais clássico da música do RS - do programa Galpão Crioulo, ainda hoje no ar. Tá tudo ali, sem tirar nem por, compondo uma das imagens mais cheia de significados do que é o verdadeiro gauchismo.

PS: Veterano foi vencedor de um dos principais festivais de música gauchesca do estado, a Califórnia da Canção Gaúcha, em 1980.

Ilustração tirada daqui.

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Um comentário:

Augusto Paim disse...

De um jeito ou de outro, a mitologia gaúcha sempre pega a gente. Acho que é porque fala de valores que grande parte dos homens busca ("sou bagual que não se entrega assim no más", por exemplo), embora esses valores tenham nuances ruins também. Outra questão é o sentimento de lar, terra natal, origem, que é fundamental na experiência de todo ser humano.
Sinto isso agora, aqui da Alemanha, embora sempre sentisse no Brasil. Esse vídeo dá saudade.
Léo, talvez fosse uma boa lincar no teu blog o programa que fizemos no Fiz sobre música brasileira. Dá uma vasculhada no blog. www.sotaquesdobrasil.blogspot.com
Grande abraço!